Quero apontar aqui as tendências que, a meu ver, atrapalham a vivência da fé na sua unidade e integralidade, o que exige vigilância da parte dos pastores:
Problema do ateísmo e do secularismo. A sociedade matou a figura paterna, a morte do pai acabou por induzir à “morte de Deus”. Hoje, há uma recusa em assumir o serviço de ser autoridade na sua inteireza. Ser pai é visto só como tolerar, perdoar, ter misericórdia, mas ser pai é também educar, corrigir e não gostamos disso! A impunidade diante dos erros com base na máxima: “o inferno existe, mas está vazio”, pode conduzir à “banalidade do mal”. Esta teoria não torna o cristianismo mais filantrópico, torna-o mais supérfluo. A conhecida máxima “se Deus não existe tudo é permitido” está em voga e abre caminho para teorias como a ideologia de gênero e outras. Enfim, “o direito de a Igreja existir no mundo moderno é contestado mesmo por cristãos” (Thomas Merton, A Igreja e o mundo sem Deus).
Antropocentrismo que leva ao relativismo em todos os campos, inclusive o ético. Neste contexto, afirma-se que o homem não só pensa, mas faz a (sua) verdade. É a fé dissociada da prática (que o Papa Francisco chama de hipocrisia). Não há Deus Pai criador e, por isso, o homem se faz Deus e tudo recria. De um lado, há os que acham suficiente acudir às urgências no empenho por um mundo justo e fraterno; por outro, há a tendência ao fundamentalismo espiritual, que deseja uma Igreja espiritualista, separando fé e vida. A fé é propriedade da Igreja e não pode ser escamoteada ao gosto de cada um ou de cada grupo.
Quase não se fala mais em pecado como ensina o Vaticano II (GS 13). É “politicamente incorreto” falar de pecado. Este não é mais objeto frequente de reflexão, homilia, exortação etc. O psicologismo, atualmente, isenta a todos de culpa. Antes, tudo era pecado; hoje, nada mais é pecado. É quase um consenso que quem é pobre está redimido dos pecados só pelo fato de ser pobre. Por isso, torna-se necessário explicitar o pecado na linha da opção fundamental e formar as consciências dos fiéis. Não se fala mais dos novíssimos: morte, juízo, inferno e paraíso, apesar de o Catecismo da Igreja Católica dedicar a eles os Artigos 11 e 12 (988-1050). É também “politicamente incorreto” falar no maligno deixando no esquecimento o que diz a Palavra de Deus: “Foi para isso que o Filho de Deus se manifestou: para arruinar as obras do diabo” (1 Jo 3, 8). De fato, “a tentação hoje é reduzir o cristianismo a uma sabedoria meramente humana, como se fosse a ciência do bem viver. Num mundo fortemente secularizado, surgiu uma gradual secularização da salvação” (RM 11).