Maior enchente da história do sul do Brasil movimenta mutirão de solidariedade

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A catástrofe natural que se abateu sobre o Rio Grande do Sul desencadeou uma verdadeira rede de solidariedade. Em 9 de setembro, também o Papa Francisco assegurou sua proximidade ao povo gaúcho, em telegrama endereçado ao presidente do Regional Sul 3 da CNBB, Dom Leomar Antonio Brustolin, arcebispo de Santa Maria, onde assegurou suas orações aos atingidos.

Por Pe. Gerson Schmidt*

Até as últimas semanas, a história registrava a enchente de 1941 como a maior tragédia climática no Rio Grande do Sul (Sul do Brasil), que atingiu todo o Estado Sulino. Não havia até então precedente e os avós contavam a história daquela tragédia das chuvas para os apreensivos filhos e netos, com fotos em preto e branco. Naquele longínquo 41, Porto Alegre tinha sido uma das cidades mais atingidas em função de sua posição geográfica, nas margens do Rio Guaíba, desabrigando na capital gaúcha 70 mil pessoas. 

 

A madrugada de terça feira (05.09.23) entrou na história, sobretudo nos municípios do Vale do Taquari (RS), como a enchente sem precedente algum até então registrado nos anais da história da região. Os volumes de chuva foram violentos no sistema do Rios Taquari-Antas, especialmente junto às cabeceiras na Serra Gaúcha, águas que desembocam no Vale, onde também se encontra a maior imagem do Cristo de braços abertos, semelhante ao Cristo Redentor do Rio de Janeiro, que agora supera a mais famosa em quatro metros de altura, localizado num dos municípios atingidos de Encantado, chamada “Cristo Protetor”. A elevação das águas foi extremamente rápida e veloz com as águas do Rio Taquari invadindo e arrasando cidades de Cotiporã, Muçum, Encantado, Roca Sales, Colinas, Arroio do Meio, Lajeado, Estrela e outras. Os centros das cidades de Roca Sales e Muçum ficaram como que um cenário pós-guerra e irreconhecível, destruindo lojas, casas, mercados, bancos, varejos em geral. A água subia metros em curto intervalo de tempo. Os atingidos não sabiam se fugiam ou salvavam alguns pertences de suas casas. Em pouco tempo, apesar dos alertas oficiais, moradores precisaram sair ou serem retirados de suas casas, conseguindo levantar alguns utensílios domésticos e elétricos de suas casas. Logo ficaram sem luz, telefonia e internet. Não havia posteriormente comunicação para pedido de socorro e informação da situação a outros parentes que buscavam notícias desesperadas dessas regiões atingidas. A cheia causou um colapso dos serviços públicos, sobretudo de água, energia elétrica. Muitas áreas nas zonas urbanas e rurais ficaram tomadas pelas águas e a maioria das pessoas tiveram que ser socorridas nos telhados de casas. Arroio do Meio teve mais de 200 casas levadas pela correnteza e força das águas volumosas, sem contabilizar as casas avariadas. Em Estrela, o segundo andar da lar dos proprietários Telmo Lopes da Silva e Dirce Rockembach, no bairro Arroio do Ouro, acolheram 23 pessoas durante a madrugada de segunda para terça, alimendo-se de pequeno pacote de bolacha e alguma fruta. Um barqueiro voluntário no local ajudou a recuperar vítimas do alagamento. 

Salão semi-destruido da Igreja N. Sra. Dos Navegantes-Arroio do Meio -RS

Salão semi-destruido da Igreja N. Sra. Dos Navegantes-Arroio do Meio -RS

Baixadas as águas, os centros das cidades de Roca Sales e Muçum ficaram irreconhecíveis. A enchente atual, segundo informações do prefeito da cidade, Danilo José Bruxel, apoiado nos especialistas, tinha superado a de 1941 em três metros. “Não perdemos mais pessoas porque não era pra ser. Pessoas gritando, chamando pelo celular e não estávamos preparados para uma situação desta”, comentou o prefeito dessa cidade de quase 22 mil habitantes. Registram-se, até essa terça-feira, mais de 47 mortes na região do Vale do Taquari e ainda inúmeros desaparecidos. 

O tamanho da tragédia e a velocidade das águas agora se atenua com a gigantesca solidariedade e o voluntarismo incansável que acontece no Vale do Alto Taquari, através de donativos de alimentos, roupa, cobertores, água, colchões, material de limpeza. A sensibilidade do povo se faz sentir em toda a parte. As paróquias das cidades atingidas transformaram seus pavilhões e salões em centros de atendimentos, acolhida e hospital de campanha, junto com outros tantos locais de atendimento de necessidades emergentes. Muitas pessoas desoladas não desejam mais permanecer nessas cidades. Pelo estrago da fúria das águas, a reconstrução das cidades será demorada, mas o Papa Francisco em mensagem solicitou rapidez para o conforto dos atingidos. 

Estragos na Capela N. Sra. Dos Navegantes - Arroio do Meio. Imagem de Maria permaneceu intacta

Estragos na Capela N. Sra. Dos Navegantes – Arroio do Meio. Imagem de Maria permaneceu intacta

Famílias arrasadas, bens perdidos, mortes e desânimos contrastam agora com a ajuda humanitária das pessoas, dos grupos, dos voluntários, da Defesa Civil e dos órgãos públicos. As colaborações são sentidas de todas as partes do Estado. A união dos vizinhos nunca foi sentida dessa forma e com essa intensidade. Há uma mobilização também sem precedentes, diante da enchente sem igual formada pelo ciclone extratropical. A velocidade da entreajuda é surpreendente. Numa das fotos abaixo se registra, no meio dos escombros dos telhados caídos de um salão paroquial da Capela N. Sra. dos Navegantes, um barco com a palavra “esperança”. 

Neste 09 de setembro, Papa Francisco escreveu um telegrama de solidariedade aos atingidos nesse acidente das chuvas, endereçada ao presidente do Regional Sul 3 da CNBB, Dom Leomar Antonio Brustolin, Arcebispo de Santa Maria. A mensagem do Papa Francisco descreve assim: 

“O Santo padre deseja manifestar a sua solidariedade orante às comunidades afetadas pelas fortes chuvas que, nos últimos dias, atingiram o Estado do Rio Grande do Sul, deixando um rastro de destruição e morte. O Papa Francisco, com sua paternal solicitude, quer assegurar a Vossa Excelência e aos demais bispos do Regional, dos sufrágios que oferece pelo eterno descanso das vítimas fatais, bem como das preces que eleva ao Altíssimo pelas famílias desabrigadas, desejando que a reconstrução das localidades atingidas ocorra de maneira rápida e eficaz como penhor de conforto, o romano Pontífice concede a toso os que foram afetados pelas grandes enchentes a Bênção Apostólica. Cardeal Pietro Parolin – Secretário do Estado”. 

Algumas fotos registradas e entrevista com o pároco da Paróquia Perpétuo Socorro de Arroio do Meio, Pe. Alfonso Antony. O comprometimento da fé cristã “nessas horas se demonstra em arregaçar as mangas e pisar no lodo”, afirmou o pároco, que agradeceu o voluntariado e enalteceu sobretudo a colaboração dos jovens na força-tarefa.

Pe. Alfonso Antony entrevistado pelo Pe. Gerson Schmidt

*Pe. Gerson Schmidt – Jornalista, assessor da Rádio Vaticano – nascido em Arroio do Meio e ordenado em Estrela (RS) – ambas cidades atingidas pelas enchentes

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