Ungulani Ba Ka Khosa – Uma voz única na literatura moçambicana

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Ungulani Ba Ka Khosa é um dos assinantes da Declaração de Paz dos Escritores Moçambicanos, difundida ontem (6/11/2024) em Maputo pela AEMO. Propõem soluções para tirar o país da crise violenta que se seguiu às recentes eleições gerais. Ao falar com o autor de Ualalapi da sua obra literária em geral, tudo isso veio à tona. Foi na emissão “África em Clave Cultural” que conta também com a crónica de Filinto Elísio e com considerações de Vincenzo Barca, tradutor de Ualalapi para o italiano.

Dulce Araújo – Vatican News

7 de novembro de 2024, Dia em a capital moçambicana está paralisada devido à intensificação das manifestações que têm vindo a acontecer em várias partes do país, na sequência das violências pós-eleições de 9 de outubro passado e que têm resultado em vários mortos, feridos e detidos.

Felizmente, há reações de intelectuais, do mundo académico, também católico, e da Associação dos Escritores Moçambicanos a propor vias de saída negociadas para a crise e salvar o país de um conflito maior.

Um desses escritores é Ungulani Ba Ka Khosa, autor, entre outros, do célebre romance histórico, Ualalapi sobre o Imperador Ngunhana, e que lhe tem proporcionado vários prémios.

Falamos com ele da sua escrita e do Moçambique de hoje. Foi no âmbito do programa radiofónico “África em Clave Cultural: personagens e eventos”.

Na entrevista ele elucida o processo que o levou à escrita, em 1987, do romance histórico Ualalapi, sobre a figura do Imperador Ngungunhana, e o entusiasmo que sentiu ao fazer ulteriores investigações sobre as suas esposas e que resultara na narrativa “As Mulheres do Imperador”. Detém-se igualmente sobre outras obras suas como “Assim não, Senhor Presidente”, publicado em 2023, e sobre assuntos ligados à difusão e tradução das suas obras no estrangeiro. Reconhece, como sustentam alguns, que é sobretudo aos moçambicanos que ele fala ao escrever e as consequências disso na difusão das suas obras no estrangeiro, onde alguns livros como Ualalapi, estão traduzidos em inglês e italiano.

Ligado profissionalmente ao ensino da História e Geografia, ele fala também do ensino da história no país com os seus desafios de hoje, sem deixar de lado a situação atual que se está a viver em Moçambique, cuja população jovenil (cerca de 70% do total) clama por oportunidades para realizar os seus sonhos.

Conheça o trajeto de Ungalani Ba Ka Khosa nesta crónica do poeta, ensaísta e editor, Filinto Elísio (Rosa de Porcelana Editora)

O poeta, ensaista e editor, Filinto Elísio

O poeta, ensaista e editor, Filinto Elísio

“UNGULANI – UMA VOZ ÚNICA DE MOÇAMBIQUE

Ungulani Ba Ka Khosa, nome tsonga (grupo étnico do Sul de Moçambique) de Francisco Esaú Cossa, nasceu a 1 de agosto de 1957, em Inhaminga, província de Sofala.

Os seus pais, de origens sena e changana, foram enfermeiros assimilados, fato que o aproximou, aos 12 anos de idade, da língua portuguesa e da leitura de escritores como Hemingway, Sartre, Dostoievsky e Gogol.

Tempos depois, e após viver em diversas localidades de seu país, Khosa dedicou-se à leitura de autores latino-americanos, atraído tanto pelas similaridades histórico-sociais com a África, quanto pela estrutura oral que faz fluir o realismo mágico presente nestes textos.

Khosa concluiu o seu ensino primário ainda na sua província, Sofala. Logo depois, terminou o seu ensino médio em outras províncias, parte em Lourenço Marques e uma outra parte em Zambézia.

Formado em Direito e em Ensino de História e Geografia, foi cronista em jornais, cofundador da revista literária Charrua e diretor-adjunto do Instituto Nacional de Cinema e Audiovisual de Moçambique.

Em 1982 ele começou a trabalhar dentro do Ministério de Educação pelo período de um ano e meio. Depois de 6 meses após sua saída do Ministério da Educação foi convidado para atuar na AEMO, a Associação de Escritores do Moçambique, onde ele ainda é integrante.

Exerceu as funções de diretor do Instituto Nacional do Livro e do Disco e é secretário-geral da Associação dos Escritores Moçambicanos.

Com a sua obra de estreia, Ualalapi (1987), integra a lista dos cem melhores autores africanos do século XX, vindo a ser desde então largamente premiado.

Ualapi é um romance histórico retratando um período relevante do colonialismo, a resistência de Ngungunhana aos colonizadores, com tudo o que isso implica. Mas também aborda a História recente.

É também autor de Orgia dos Loucos (1990), Histórias de Amor e Espanto (1993), Os Sobreviventes da Noite (2005), Choriro (2009), O Rei Mocho (infanto-juvenil, 2012), Entre as Memórias Silenciadas (2013), Cartas de Inhaminga (2017), Gungunhana (2018) e Assim não Senhor Presidente (2023).

É conhecido por escrever principalmente romances e contos, e já ganhou diversos prêmios por suas obras. Ele alia as histórias tradicionais a uma noção consciente de História.

Ao lhe ser perguntado como seria o romance nacional, ele responderia que o mundo moçambicano é tão diversificado e rico que cabemos todos, dificilmente haveria um único romance nacional. Abrem-se muitos caminhos, talvez daqui a 50 anos se possa fazer esse caminho.

Foi agraciado com o Grande Prémio em Ficção Narrativa, pelo Ualalapi, em 1990, o Prémio Nacional da Ficção, também por Ualalapi, em 1994; Figura entre os 100 maiores romances da África no século XX, com o Ualalapi, no ano de 2002, venceu o troféu José Craveirinha da Literatura, por conta do livro Os sobreviventes da noite em 2005 e o Prémio BCI da Literatura, por conta do livro Entre as memórias silenciadas em 2013.

Em fevereiro de 2014, em cerimónia ocorrida em Maputo, foi condecorado pelo Presidente da República Portuguesa com o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, pelo contributo que tem dado para o enriquecimento das letras moçambicanas e a divulgação de Moçambique e das suas culturas a nível internacional.

Em 2018, foi-lhe outorgado a Ordem do Rio Branco, Grau como Comendador pelo Governo Brasileiro, pelos 30 anos da carreira literária, que começou com a publicação do Ualalapi. Recebeu ainda o Prémio José Craveirinha da Literatura, pelo conjunto da sua obra literária e em 2024 o Prémio Literário, Guerra Junqueiro.”

Crónica do Filinto sobre Ungulani Ba Ka Khosa

Ualalapi foi traduzido, em 2004, para o italiano por Dr. Vincenzo Barca, médico psiquiatria, formado também em literaturas e línguas estrangeiras, português em particular, de que foi professor. Na entrevista para o supracitado programa radiofónico, ele fala do seu encontro com o autor na altura em que estava a fazer a tradução, da importância e valor literário de Ualalapi, assim como da obra Os Sobreviventes da Noite que também traduziu. Põe igualmente em relevo o facto de Ungulani escrever pensando sobretudo nos moçambicanos; e ainda o seu desejo de ver essas obras mais difundidas em Itália.

Dr. Vincenzo Barca

Dr. Vincenzo Barca

Aqui a emissão “África em Clave Cultural: personagens e  eventos” do dia 7/11/24

Fonte

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