O Custódio da Terra Santa relata à mídia vaticana o pesadelo da guerra com os olhos de quem está em Jerusalém. “Neste momento”, diz padre Patton, “muitos aqui, e não apenas entre os cristãos, têm o desejo de deixar um país que nos últimos anos parece incapaz de garantir a paz e que se envolveu em uma espiral de guerra”.
Roberto Cetera – Vatican News
A Terra Santa está novamente no centro de tensões regionais, com consequências que recaem sobre as populações locais, incluindo os cristãos. “Parece que caímos em um novo pesadelo”, declara à mídia vaticana o padre Francesco Patton, Custódio da Terra Santa. “Antes víamos a destruição causada pela guerra nos territórios vizinhos, agora a vemos no coração da Terra Santa”.
Jerusalém está novamente sob ataque. Como os cristãos da Terra Santa estão vivendo este momento difícil?
Os cristãos, assim como o resto da população, estão assustados. Já vi pessoalmente o terror das crianças durante a guerra na Síria, ouvi relatos de Gaza, e agora isso também está acontecendo aqui: crianças tremendo quando ouvem as sirenes de alarme e depois as explosões dos mísseis. São traumas que levarão consigo para toda a vida. Depois, há um silêncio surreal nas ruas, não só pela ausência dos peregrinos, mas também dos fiéis locais, que em muitos casos se veem impedidos de ir à igreja. A militarização das ruas é impressionante. Para mim, que sou um amante do Apocalipse, que fala da Jerusalém celestial como uma cidade com as portas sempre abertas, é impressionante ver as portas da cidade terrena fechadas e vigiadas. Penso que, neste momento, muitos aqui, e não apenas entre os cristãos, têm o desejo de deixar um país que, nos últimos anos, parece incapaz de garantir a paz e se envolveu em uma espiral de guerra que se alastra continuamente como um fogo que não se consegue mais controlar.
Imaginamos que para os frades os últimos 20 meses tenham sido caracterizados por tensões e perigos, em Israel e na Palestina, mas também na Síria e no Líbano. A Igreja universal aprecia o que os senhores estão fazendo pela proteção dos santuários e pelas muitas obras de caridade que apoiaram nestes meses. Qual é o clima predominante entre os frades?
Aqui não são apenas os últimos 20 meses que foram caracterizados por tensões e perigos. Nos últimos 20 meses, o conflito também atingiu aquela parte da Terra Santa que antes era relativamente estável, mas sempre prestes a explodir, por razões que vocês explicaram várias vezes em seu jornal. Se eu olhar para a história da nossa presença, nunca desfrutamos de longos períodos de tranquilidade. Há poucos dias celebramos Santo Antônio, padroeiro da Custódia (ele se tornou padroeiro porque nos protegeu em momentos muito difíceis, em que se queria cancelar a nossa presença). Também este ano renovamos o nosso voto e a nossa confiança, porque o primeiro apoio “eclesial” nos vem daquela que outrora se chamava a “Igreja triunfante”, ou seja, dos santos, através da comunhão em Deus na oração. Depois, estamos aqui em nome e por mandato da Igreja. Sempre sentimos o apoio dos Papas ao longo da história e, pessoalmente, senti fortemente o apoio do Papa Francisco, que nos visitou nestes anos, nos confirmou, nos escreveu palavras de apreço e encorajamento, e estou certo de que também o Papa Leão XIV nos encorajará a perseverar nesta missão. Estou ansioso por poder encontrá-lo e contar-lhe o que vivemos e estamos a vivendo.
Sempre sentimos também o apoio da Congregação, hoje Dicastério para as Igrejas Orientais: o precedente Prefeito, cardeal Leonardo Sandri, visitou-nos várias vezes e escreveu-nos palavras de apreço e encorajamento, juntamente com o Santo Padre, sobretudo por ocasião dos centenários da chegada dos primeiros frades (1217-2017), da vinda de São Francisco à Terra Santa (1219-21019) e da instituição dos Comissários da Terra Santa (1421-2021). O novo Prefeito também não deixou de ter gestos de atenção, dando um forte impulso à retomada da “Coleta da Sexta-feira Santa”, enviando-nos alguém que pudesse ver de perto a situação atual para nos dar conselhos e apoio neste momento difícil, e nos prometeu que estará entre nós em novembro, quando se realizará o congresso internacional dos Comissários da Terra Santa em Jerusalém. Nestes vinte meses, recebemos também a visita de muitos bispos e sacerdotes, que vieram expressamente para manifestar a sua proximidade e solidariedade num momento tão difícil. Os últimos, por ordem cronológica, foram o arcebispo de Perugia, dom Ivan Maffeis, com um grupo de sacerdotes da sua diocese, e o arcebispo de Siena, cardeal Paolo Lojudice, com toda a Conferência Episcopal da Toscana. Estes últimos puderam tocar com as próprias mãos o que significa estar na Terra Santa e cuidar tanto dos Lugares Santos quanto dos cristãos locais.
O vigário custodial, padre Ibrahim Faltas, foi um dos promotores dos corredores humanitários que permitiram que muitas crianças de Gaza fossem levados para a Itália. Os senhores têm outras iniciativas desse tipo em preparação?
O vigário custodial, padre Ibrahim Faltas, sempre se dedicou a todas as causas humanitárias nos últimos 20 anos. As operações a que você se refere são as relacionadas à transferência para hospitais italianos de crianças feridas e mutiladas de Gaza. Ultimamente, ele também colaborou na transferência do pequeno Adam, mas a maioria das ações humanitárias que promove permanecem, com razão, ocultas. De fato, até mesmo a recente transferência dos bispos toscanos para Amã, logo após o início da guerra com o Irã, foi organizada pelo vigário. Mas, se me permite, seu maior compromisso humanitário, nestes anos, tem sido trabalhar assiduamente pela requalificação das escolas da Terra Santa e pela educação para a paz e a convivência das novas gerações.
A Basílica do Santo Sepulcro foi extraordinariamente fechada aos fiéis. Quais são os conventos onde os frades correm maior perigo neste momento?
Atualmente, os conventos que correm maior perigo são os que se encontram em zonas urbanas, como os conventos de Jaffa e Ramle, os de Haifa e Acco, mas também os aqui em Jerusalém. Como se sabe, não existem bombas inteligentes e quem ataca normalmente o faz com a intenção de assustar a população. Já não existe o respeito pelas “regras” do direito internacional da guerra e, portanto, estamos todos no mesmo barco, sem distinção de etnia ou religião. De qualquer forma, já nos encontramos em situações semelhantes no passado, faz parte da vocação missionária, e uma coisa é certa: não somos mercenários que abandonam o rebanho para salvar a si mesmos, esta é a missão que a Igreja nos confiou e aqui permaneceremos, confiando na ajuda do Céu.