Leão XIV recebeu na manhã deste sábado, 18 de outubro, os participantes do Jubileu dos Ciganos e Povos Itinerantes, reunidos na Aula Paulo VI, no Vaticano. Música, cantos, danças, leitura de escritos, testemunhos, antes da chegada do Pontífice, que exorto a serem “protagonistas da mudança de época em curso”, fazendo “conhecer a beleza da sua cultura” e “compartilhando a fé, a oração e o pão fruto do trabalho honesto”
Raimundo de Lima/Mariangela Jaguraba – Vatican News
Após dar-lhes as boas-vindas, recebendo-os na Sala Paulo VI, no Vaticano, por ocasião do Jubileu dos Ciganos e Itinerantes, Leão XIV disse que eles vieram a Roma de toda a Europa — alguns até de fora da Europa — como peregrinos de esperança neste Jubileu. Com a sua presença, lembramo-nos de que “a esperança é itinerante” — o título do nosso encontro — e hoje todos nos sentimos impelidos a caminhar pelo dom que trazem com vocês ao Papa: a sua fé forte, a sua esperança inabalável somente em Deus, a confiança sólida que não cede às fadigas de uma vida muitas vezes à margem da sociedade.
“Que a paz de Cristo esteja em seus corações”, disse-lhes! “E que a paz esteja também nos corações dos numerosos agentes pastorais que aqui estão presentes e que caminham incansavelmente com vocês”.
Primeiro histórico encontro com São Paulo VI
A celebração jubilar de hoje ocorre sessenta anos após o histórico primeiro encontro mundial que o Papa São Paulo VI teve com as suas comunidades, em Pomezia, em 26 de setembro de 1965. Quase como testemunha desse acontecimento, está aqui hoje, a imagem de Nossa Senhora, que o próprio Pontífice coroou como “Rainha dos Ciganos, dos Sinti e dos Itinerantes”. Ao longo destes sessenta anos, os encontros com os meus predecessores têm-se verificado cada vez com mais assiduidade, em diversos contextos, sinal de um colóquio vivo e de um cuidado pastoral especial para com vocês, “porção predileta do povo peregrino de Deus”. Sim, Deus Pai os ama e os abençoa, e a Igreja também os ama e os abençoa.
Vocês podem ser testemunhas vivas da centralidade destas três coisas: confiar somente em Deus, não se apegar a nenhum bem mundano e mostrar uma fé exemplar em ações e palavras. Viver assim não é fácil. Aprende-se acolhendo a bênção de Deus e permitindo que ela trabalhe para transformar o nosso coração. “O coração da Igreja, por sua própria natureza, é solidário com os pobres, os excluídos e os marginalizados, com aqueles considerados ‘descarte’ da sociedade. […] No coração de cada fiel, há a necessidade de ouvir aquele grito que vem da obra libertadora da graça em cada um de nós; portanto, esta não é uma missão reservada apenas a alguns”.
Peregrinos e nômades, por quase mil anos
Por quase mil anos, vocês foram peregrinos e nômades num contexto que construiu progressivamente modelos de desenvolvimento que se mostraram injustos e insustentáveis em muitos aspectos. Por essa razão, as chamadas sociedades “progressistas” os descartaram consistentemente, marginalizando-os sempre: as margens das cidades, as margens dos direitos, as margens da educação e da cultura. No entanto, o próprio modelo de sociedade que os marginalizou e os tornou itinerantes, sem paz nem acolhimento — primeiro em caravanas sazonais, depois em acampamentos nas periferias das cidades, onde às vezes ainda vivem sem eletricidade ou água — foi o que criou as maiores injustiças sociais em todo o mundo ao longo do último século: enormes desigualdades econômicas entre indivíduos e povos, crises financeiras sem precedentes, desastres ambientais e guerras.
Mas nós, na fé em Jesus Cristo, sabemos que “a pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular”, e assim somos cada vez mais fortalecidos na convicção de que os mesmos valores que os pobres defendem com grande dignidade e orgulho são aqueles para os quais todos devemos olhar para mudar de rumo. A sua presença nas periferias do Ocidente é, de fato, ao qual fazer referência no campo da eliminação de muitas estruturas de pecado, para o bem e o progresso da humanidade rumo a uma convivência mais pacífica e justa, em harmonia com Deus, com a criação e com os outros.
O apelo de Francisco em 2019 aos ciganos e itinerantes
O Santo Padre exortou-os a não desanimarem! Ao estarem mais próximos da condição de Cristo, pobre e humilhado, vocês lembram à humanidade o “paradigma da vida cristã”, disse, encorajo-os a acreditar na beleza salvadora que a sua cultura e a sua situação itinerante trazem consigo. Leão XIV retomou o apelo sincero que o Papa Francisco, em 2019, fez aos ciganos e itinerantes:
“Peço-lhes, por favor, que tenham um coração maior, ainda mais amplo: sem ressentimentos. E que sigam em frente com dignidade: a dignidade da família, a dignidade do trabalho, a dignidade de adquirir o pão de cada dia – é isso que os faz seguir adiante – e a dignidade da oração.”
“Que a dignidade do trabalho e a dignidade da oração sejam a sua força para derrubar os muros da desconfiança e do medo”, exortou-os, por sua vez, o Papa Leão XIV.
colóquio espontâneo
Entre aplausos e coros, quatro participantes – entre eles duas crianças – fizeram perguntas a Leão XIV, que respondeu espontaneamente, isto é, sem um texto previamente preparado. A primeira é sobre a amizade com Jesus, vínculo que, explicou ele, nasce da oração, da Palavra de Deus, dos sacramentos e da vida da Igreja, que levam ao conhecimento: “Não podemos ser amigos de alguém que não conhecemos; ser amigos significa procurar conhecer o outro”. Em seguida, o tema da guerra, relevante para todos – adultos e crianças –, porque “todos queremos viver em um mundo sem guerra”, afirmou o Santo Padre. “Devemos sempre procurar ser promotores da paz, construtores de pontes, firmemente convencidos de que a paz é possível, não é apenas um sonho, que podemos viver em paz”. Para fazer isso, para “mudar o mundo”, é preciso começar por nós mesmos: com os amigos, com os colegas de estudo, na família, entre as famílias. “É muito relevante que sempre busquemos essa capacidade de colóquio, de respeito mútuo e de promover os valores que nos ajudam a construir um mundo de paz”.
Acredito que isso é possível e espero que um dia todos encontremos, vejamos um mundo onde reine a paz e todos possamos viver em paz.
Não aos preconceitos e distinções
Em seguida, Leão XIV exortou a superar preconceitos, críticas e distinções em relação àqueles que são “diferentes”. E a imitar os mais pequeninos: “Quando as crianças veem outra criança, querem brincar, querem ver como fazer amizade, não se preocupam com a diversidade, mas dizem: podemos brincar juntos, podemos viver juntos em paz… Somos nós, adultos, que começamos a dizer: ‘Mas ele é assim ou ela é assim, esta cultura, esta nação, esta religião são coisas diferentes’ e começamos a fazer uma certa separação, certos julgamentos”. Devemos “deixar um pouco de lado essas distinções de quem é diferente e começar com o respeito por todos os seres humanos”.
Todo ser humano nasce à imagem de Deus. Se alguém é pobre, alguém vem de uma família rica, alguém tem propriedades, alguém não tem, somos todos irmãos e irmãs. Então, respeitemos essa fraternidade de todos e veremos que também aí o mundo poderá mudar.