Dom Júlio Akamine, COP30: a grande contribuição da Igreja é a conscientização das pessoas

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A Rádio Vaticano – Vatican News conversou com o arcebispo de Belém: “a Igreja vê a natureza não somente como um depósito de grandes recursos naturais, de commodities, de mercadorias, de crédito, de carvão. A Igreja não vê as coisas dessa maneira. A Igreja vê, não na ordem da economia, mas na ordem do amor. É a obra do Criador, destinada a todos”.

Silvonei José – Belém

A cidade de Belém, porta de entrada da Amazônia, recebeu nas últimas duas semanas líderes mundiais e delegações de mais de 190 países para a COP30 a Conferência sobre o Clima da ONU. A cidade se preparou para o evento da melhor maneira possível, como também a arquidiocese de Belém, através de uma Comissão especial que orientou e acolheu representantes da Igreja Católica do Brasil e da Santa Sé. Para um balanço sobre essas atividades nós conversamos com o arcebispo de Belém, dom Júlio Endi Akamine, que assumiu o cargo em 6 de agosto de 2025, sucedendo dom Alberto Taveira Corrêa.



Dom Júlio

Dom Júlio, Belém recebeu povos de todas as partes do mundo para uma reflexão sobre o clima, mudanças climáticas. A Igreja Católica esteve presente nessa reflexão e de modo incisivo, com vários painéis, com várias associações, cardeais, bispos e arcebispos. A sua arquidiocese recebeu a Igreja Católica do Brasil e membros da Santa Sé, e ajudou a construir também essa narrativa. Começamos dessa narrativa. Como foi a participação da Igreja Católica nessa COP, mas também a construção desse caminho que, através da arquidiocese, foi feita.

Bem, o trabalho de preparação foi muito intenso. principalmente por parte de dom Paulo, (dom Paulo Andreolli, bispo auxiliar de Belém), que organizou muitos eventos paralelos à COP30, também a preparação ali na participação na COP30. Também através de dom Alberto (dom Alberto Taveira, arcebispo emérito de Belém), que se encarregou muito da questão logística, hospedagem, acolhida da delegação da Santa Sé, do secretário de Estado da Santa Sé.

E eu fiquei mais na supervisão geral. Na verdade, quem trabalhou mesmo foram os dois. De fato, como eu estava chegando… recém-chegado à Arquidiocese de Belém, tinha pela frente o Sírio de Nazaré e a COP30, então tive que me valer muito também da experiência, tanto de dom Paulo quanto de dom Alberto. De fato, eles foram aqueles que carregaram o piano para a preparação, na execução, na realização da COP30. De fato, tivemos uma presença significativa da Igreja Católica na COP30, acho que até reconhecido por outras pessoas, e isso nos deixa muito contentes.

Se a preparação nos trouxe muita preocupação e, às vezes, também dor de cabeça, a realização nos trouxe também uma felicidade muito grande. Ver o interesse, a participação de tantos… bispos, cardeais, pessoas da Igreja, pessoas engajadas nos diversos movimentos sociais, nas organizações da igreja, estiveram presentes aqui na COP30.

Então, essa realização nos deixou muito contentes. Acho que valeu a pena todo o trabalho realizado. E esperamos agora os frutos de tudo isso. Isso. Conforme já foi dito, as decisões são importantes. A gente espera que as decisões sejam mais corajosas. Mas mais relevante do que as decisões é colocar em prática.

Da parte da igreja, eu acho que a grande contribuição é o trabalho na conscientização das pessoas. O trabalho árduo, trabalhar com a consciência. É muito mais fácil manipular. Acho que isso é muito melancólico quando acontecem essas coisas. Mas a Igreja quer, de fato, formar a consciência das pessoas. Eu acho que essa é a grande contribuição que a gente pode dar.

Belém pode ser um divisor de águas também para a própria Igreja, para a atuação nessas mudanças climáticas, nesse pensamento que a gente vê que brota também de modo perentório aqui em Belém.

Eu acho que para a igreja não é tanto um divisor de águas, no sentido de que a Igreja já está engajada nisso há muito tempo. Principalmente a Igreja no Brasil. Veja, por exemplo, as campanhas da fraternidade. Já em 79 já falamos, “preserve que é de todos”. Então, a Igreja é protagonista e está na vanguarda também, do enfrentamento da… das mudanças climáticas. Muito mais do que isso, a Igreja vê a natureza não somente como, um depósito de grandes recursos naturais, de commodities, de mercadorias, de crédito, de carvão. A Igreja não vê as coisas dessa maneira. A Igreja vê, não na ordem da economia, mas na ordem do amor. É a obra do Criador, destinada a todos. E eu acho que essa é a grande contribuição que a igreja pode dar. Então, se trata de uma continuidade. Eu acho que, lógico, um divisor de águas, sem dúvida, eu acho que também podemos considerar nesse aspecto. Mas eu prefiro ver mais como uma continuidade, de um trabalho que nós recebemos. Se a gente conseguiu, se a Igreja participou de maneira muito ativa da COP30 aqui em Belém, marcou uma presença. Não só quantitativa, mas qualitativa. Isso se deve ao trabalho das gerações anteriores, que nós recebemos. Graças a Deus, acho que nós honramos também isto que nós recebemos, e esperamos transmitir isso para as próximas gerações.

Olhando um pouco também para a sua arquidiocese, para a cidade de Belém, que vestiu realmente a camisa para acolher, hospedar tantas pessoas. A COP pode ajudar também nessa discussão, nessa nova narrativa também aqui para a própria Belém.

Sem dúvida, eu acho que isto vai trazer para as pessoas uma consciência maior. Também mudança nos hábitos. Acho que o Papa Francisco chamou atenção para isso, de que as mudanças do nosso modo de viver, do nosso comportamento, dos nossos hábitos de consumo e do uso dos bens da Terra, eles talvez de modo imediato deem pouco resultado. Mas é exatamente isso que está,

essas mudanças, é aquilo que está na base das grandes mudanças que nós vamos ter que fazer. Sem esse engajamento, esse comprometimento pessoal, consciente, responsável de cada um, as grandes mudanças não se farão. Podem até ser impostas, mas é muito melhor que as pessoas, de fato, assumam isso de maneira consciente e responsável. Então, eu acho que o legado para a arquidiocese de Belém é exatamente esse. Isso me deixa muito esperançoso.

Nós tivemos vários momentos em que a Igreja Católica foi protagonista, por exemplo, o Simpósio da Igreja Católica, um momento de reflexão profunda.

Sim, um Simpósio que foi internacional, teve representantes do mundo todo. E depois também não foi só o Simpósio, teve também um gesto muito concreto da caminhada que foi feita, uma pequena procissão, mas acho que é significativo, culminando com a celebração da Eucaristia. A Eucaristia que é uma antecipação daquilo que… também a obra de Deus espera de nós. São Paulo disse que a criação, geme, sofre as dores de parto esperando a manifestação da grandeza dos filhos de Deus. Então também a natureza está destinada à participação desta glorificação. E a Eucaristia é uma antecipação, uma concretização disso, daquilo que é a celebração do mistério, um fragmento do nosso mundo criado, transfigurado no corpo e sangue de Cristo.

Então as discussões, a reflexão, a ciência, a responsabilidade. Depois o gesto concreto e a celebração eucarística.

Tivemos também um outro momento, a Cúpula dos Povos e a grande marcha. Tivemos 60, 70 mil pessoas pelas ruas de Belém pedindo respostas, e respostas para aqueles que hoje podem decidir.

Eu acho que a participação das pessoas é muito significativa. Essa marcha foi, de fato, surpreendente. Todos aqueles que participaram, de fato, ficaram impressionados com o número, mas também com a diversidade dos grupos, das organizações que participaram. Significa que nós podemos colaborar, não é? Apesar de tantas diferenças, a gente olha para tudo isso com esperança, no sentido de que a colaboração é possível. De fato, as iniciativas individuais ou as iniciativas mais privadas, elas podem dar algum resultado, mas o resultado é uvidoso e, às vezes, pouco duradouro. Quando a gente colabora, quando a gente coopera entre si, os resultados são mais certos, abundantes e duradouros. Acho que essa é a grande mensagem que a Cúpula dos Povos deu e também essa Marcha.

Uma última pergunta, falando um pouco da sua realidade agora. O senhor, como arcebispo de Belém, tivemos o primeiro grande evento com uma procissão que hoje parece que é a maior expressão da Igreja em todas as partes do mundo, o Sírio de Nazaré. Como é que o senhor está vivendo agora nessa sua nova lar?

Bom, eu me sinto muito bem. O pessoal sempre me pergunta se eu estou gostando. Eu não estou gostando, estou amando. E as pessoas me perguntam sempre se eu estou me adaptando. Me adaptar é uma coisa muito secundária. Logo, desde o primeiro dia, eu me senti em lar e percebo que as pessoas também me acolheram como um dos seus, não como forasteiro, como estrangeiro. Aquilo que Jesus disse, quem deixar pai, mãe, filhos, terras e assim por diante, vai receber o cêntuplo. Eu faço essa experiência todos os dias aqui em Belém, de ter recebido o cêntuplo, já aqui na Terra.

Jesus disse também que vai receber com perseguição e com cruz, mas o fato de ter esse centro já é uma grande força. Então, eu fiquei muito impressionado com o Sírio de Nazaré. Sempre o pessoal diz que Sírio a gente não explica, a gente vive. É verdade, tem razão. Uma coisa é a gente ouvir os relatos, outra é a gente participar pessoalmente.

A primeira coisa que eu senti nesse Sírio foi um grande medo, porque é uma multidão. E olhando aquela multidão, eu falei, mas isso aqui, essa multidão é incontrolável. Nós não vamos conseguir levar a imagem até a catedral e depois trazer da catedral de volta para a Basílica. Mas nós fizemos isso. Então, foram dois milagres, né? Dois milagres, inclusive por causa de Nossa Senhora, por causa da devoção a Nossa Senhora. Porque aquela multidão não tem como você controlar, não tem como você organizar aquela multidão. E mesmo assim, todas as coisas saíram a contento. A procissão não teve incidentes. Foram 14 procissões, nenhuma delas deu problema. Eu sempre falo para as pessoas, isso foi um milagre. Eu acho que um milagre só é possível porque as pessoas têm grande devoção a Nossa Senhora.

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