O testemunho de Nello Scavo, enviado do jornal da Conferência Episcopal Italiana, “Avvenire”, sobre o drama humanitário que continua a se consumir entre aqueles que pressionam na fronteira greco-turca. Hoje, o Presidente Erdogan, em conversa com as instituições da União Europeia.
Marina Tomarro, Silvonei José – Cidade do Vaticano
O governo alemão anunciou que uma coalizão de países voluntários da União Europeia planeja assumir a responsabilidade de até 1.500 menores atualmente bloqueados nas ilhas gregas como medida de apoio humanitário. “Queremos ajudar a Grécia a enfrentar a difícil situação”, explicaram os partidos da coalizão governamental da chanceler Angela Merkel. “São – disseram -, crianças que necessitam de cuidados urgentes devido a uma doença ou crianças desacompanhadas com menos de 14 anos, em sua maioria meninas”.
Hoje Erdogan em Bruxelas
Entretanto, o governo turco exortou a Grécia a abrir as suas fronteiras e permitir a entrada de migrantes em outros países europeus. Nesta segunda-feira o presidente Erdogan está em Bruxelas para uma série de conversas sobre a estabilidade da região com o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, e a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen. O objetivo declarado do presidente é conseguir a modificação do acordo de 2016 sobre os migrantes entre a Turquia e a União Europeia, como ele antecipou. Erdogan acusou mais uma vez publicamente a Grécia e a União Europeia de usar comportamentos desumanos para com os migrantes que tentam desesperadamente atravessar a fronteira greco-turca.
O drama dos migrantes na fronteira
Entretanto, a situação dos migrantes está se tornando cada vez mais grave, como nos conta o jornalista do jornal italiano Avvenire, Nello Scavo, que nestes dias foi enviado para a zona de fronteira entre a Turquia e a Grécia. “O que vimos, e o que também documentamos – disse Scavo -, é o uso de seres humanos como armas não convencionais de uma guerra entre potências. Milhares e milhares de pessoas foram amontoadas ao longo da fronteira, sabendo que seria impossível para elas atravessar. Esta manhã, as autoridades gregas nos informaram que as últimas rejeições envolveram mais de 1.400 pessoas só ontem. Isto significa que os confrontos serão sempre muito intensos até que seja encontrada uma solução política. As autoridades gregas estão reagindo, gás lacrimogêneo e granadas de fumaça também têm sido usadas. Por outro lado, o mesmo está ocorrendo no lado turco. Também vimos migrantes serem espancados pela polícia turca porque já não queriam mais atacar a linha de fronteira. E assim elas são realmente pessoas esmagadas entre dois fogos”.
Como é que estas pessoas vivem?
R. – É muito difícil até para os jornalistas europeus contar a situação de maneira exata, porque o acesso à área era muito complicado, fomos rejeitados e ameaçados de prisão várias vezes pela polícia grega. O que vimos foi que eles simplesmente pedem para passar porque lhes foi prometido nos campos onde estavam antes, especialmente perto de Istambul, que seria fácil atravessar a fronteira europeia. Pelo contrário, eles se viram contra um verdadeiro muro. Começa a faltar alimentos, até mesmo os hidrantes de incêndio da parte grega estão sendo usados, o que significa que a fronteira se torna um pântano. Muitos migrantes não têm roupas para trocar e por isso estão literalmente no gelo, a sua saúde é realmente precária, o que os deixa muito nervosos. Entre outras coisas, em condições climáticas difíceis, basta um raio de sol para encorajar os grupos a tentar o assalto à fronteira novamente, com o resultado neste momento de ficar ferido; houve pelo menos 4 mortes sobre as quais há incertezas sobre a responsabilidade e várias dezenas de feridos, e recordamos que tudo isso ocorre dentro da União Europeia.
Por que há uma certa desatenção por parte da sociedade diante de um drama tão óbvio?
R – Há várias razões. Algumas delas dizem respeito em particular às condições de empobrecimento da população grega que sofre a presença de migrantes como uma ameaça a uma economia já por si precária. Falando com os cidadãos, especialmente de Kastani, que é a localidade onde esses grupos mais se enfrentam, percebemos muita decepção das pessoas que esperavam uma maior presença da União Européia, que não resolveria somente com a promessa de enviar dinheiro. Deve também ser dito que esta questão está sendo utilizada por uma certa política europeia de extrema-direita. Nós dissemos e documentamos a caça aos migrantes por grupos paramilitares gregos tolerados pelas autoridades, aos quais estão se acrescentando grupos da Alemanha, Itália, Hungria e Áustria. Então estas pessoas estão sendo realmente esmagadas por interesses maiores.
Chegou de Berlim a notícia de que serão acolhidas 1.500 crianças em diversos países europeus para poder curá-las. Na sua opinião, este passo é uma primeira abertura da União Europeia à crise humanitária?
R – Sim, é uma primeira abertura legítima, também depois do corajoso apelo, como sempre, do Papa Francisco. O fato dessa notícia chegar na véspera do encontro entre Erdogan e a cúpula europeia faz bem esperar um desbloqueio da situação, mesmo que ainda não seja para uma solução definitiva, porque os conflitos estão em curso e a partida é jogada em outras mesas, incluindo a mesa líbica, onde a Turquia está muito comprometida e também aqui Erdogan provavelmente vai pedir concessões à União Europeia. Esperamos que, começando pelas crianças, lentamente, se encontrem soluções melhores para todas estas pessoas.