Padre Federico Lombardi, presidente da Fundação vaticana intitulada ao Papa falecido em 31 de dezembro, assina o prefácio do volume publicado por Rizzoli e pela Livraria Editora Vaticana, que contém dez falas centrais do pontificado, desde a inaugural até a última audiência geral passando por Regensburg e Auschwitz.
Federico Lombardi
Como todos sabemos, não só os escritos, mas também os discursos e homilias proferidos pelo Papa Ratzinger durante o seu governo da Igreja foram imensamente mais de dez, e quase sempre de riquíssimo conteúdo e eminente qualidade expressiva. Se então alargarmos o nosso olhar a toda a obra de Joseph Ratzinger, mesmo antes do papado (e também depois), deparamo-nos com um vasto mar, que graças à publicação da Opera Omnia, ainda em curso, poderá ser percorrido e explorado por muito tempo. Toda escolha é, portanto, necessariamente redutiva e até certo ponto discutível.
Ao mesmo tempo, o pensamento de Bento XVI é tão coerente, digamos também “orgânico” no seu conjunto e no seu desenvolvimento, que as suas linhas mestras podem ser vistas a partir de uma escolha limitada dos seus textos.
Nesta coleção nos limitamos estritamente ao tempo do pontificado. É o Papa Bento XVI quem fala. Para que seja facilmente legível, foi apresentada em tamanho reduzido. Daí a escolha de dez textos, necessariamente arbitrária, mas de número simbolicamente completo.
Percorrendo o índice, se vê que se trata sempre de “discursos”, ou seja, textos realmente pronunciados oralmente de forma integral diante de um público específico. Não são “escritos” ou “documentos” magistrais, nem enriquecidos por extensa documentação. São de comprimento limitado e caracterizados por um contexto concreto. Isso não impede ao Papa Bento de ampliar seu olhar aos horizontes do mundo e da história, mas determina a cada vez a escolha do tema e do gênero expressivo, que ele mesmo indica com muita clareza ao introduzir suas falas.
Os tempos dos discursos são diversos e se distribuem por todo o pontificado. Uma coisa é falar a toda a Igreja no grande dia da posse do pontificado, outra é falar aos sacerdotes no momento dramático da crise dos abusos sexuais, outra é falar na última audiência geral, despedindo-se dos fiéis. Portanto, se vai do começo ao fim de um papado.
Os lugares também são diferentes. Uma coisa é falar aos fiéis reunidos na Praça São Pedro ou conectados por áudio-vídeo de todas as partes do mundo, outra é falar à Cúria Romana, outra é falar aos jovens da Jornada Mundial da Juventude em Colônia. Outra ainda é falar no campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau, outra coisa é falar na Universidade de Regensburg, outra é falar no Reichstag de Berlim no Parlamento Alemão e assim por diante. Porém, não escapa ao observador atento que todos os lugares estão na Europa. Em certo sentido, não é coincidência. O último “Papa europeu” conhece profundamente a cultura e a história do seu continente, e está convencido de que não é por acaso que a forma assumida pela fé cristã em colóquio com a razão se formou na Europa, e aqui se verificaram as dramáticas fraturas no colóquio entre fé e razão, que aqui é obrigado a continuar a se comprometer para o continua-lo e restabelecê-lo, ao serviço de toda a humanidade.
Quem fala é sempre Bento XVI – inequivocamente ele. Com a vastidão de sua cultura, a clareza de exposição até mesmo para argumentos complexos, sua paixão pela busca da verdade, a profissão explícita de sua fé católica. Não é supérfluo observar que dos inúmeros discursos e falas que cada Papa lê ou pronuncia durante as audiências de todos os tipos, uma grande parte naturalmente não foi redigida por ele pessoalmente, mas por seus colaboradores, e o Papa “os faz seus” depois de ter verificado a fidelidade à sua mente. Isso também se aplica ao Papa Ratzinger, embora menos que a outros. Mas para os discursos desta coleção podemos ter a certeza de que são absolutamente “dele”, da primeira à última palavra. Trata-se de ocasiões muito importantes para não assumir plenamente a responsabilidade pela escolha de cada palavra e argumento.
Se nos é permitido acrescentar algumas palavras aos dez discursos selecionados, podemos distingui-los em dois grupos de cinco. Aqueles dirigidos à vida da Igreja e aqueles dirigidos ao mundo da cultura, da sociedade e da política.
«A Igreja está viva. Esta é a maravilhosa experiência destes dias» (24 de abril de 2005). «Estou realmente comovido! E vejo a Igreja viva» (27 de fevereiro de 2013). O pontificado se abre e se fecha com o mesmo testemunho: a vitalidade da Igreja que lhe foi confiada para guiar. Apesar das dificuldades, a Igreja está viva porque Cristo está vivo, ressuscitado, e a Igreja pertence a Ele, que é o Bom Pastor e a acompanha, permanecendo no seu barco mesmo nos momentos de tempestade.
Não há outro programa a ser cumprido senão deixar-se guiar por Ele com confiança. Apascentar significa amar, significa mostrar Deus aos homens, o Deus que podemos achar em Cristo e que nos salva dos desertos e das trevas para nos conduzir à vida e à luz. O primeiro discurso de Bento termina com um apelo aos jovens para que não tenham medo de Cristo, que nada tira e tudo dá. Ressoa o eco do primeiro grande discurso do Papa Woytjla: “Não tenhais medo, abri as portas a Cristo!”. A história da Igreja, dentro e na sua projeção missionária, só pode ser compreendida na fé.
Bento encontrará os jovens alguns meses depois, na Jornada Mundial da Juventude em Colônia, e os convidará a caminhar, como os Magos, no caminho da Igreja no tempo. Uma Igreja com seus erros e defeitos, feita de pecadores, mas também de santos. Estes são os verdadeiros revolucionários da história e nos ensinam o estilo de Deus, não o poder, mas a verdade, o direito, a bondade, o perdão, a misericórdia, construindo um espaço de comunhão e unidade entre continentes, culturas, nações, seguindo a estrela de Cristo, que ilumina a história.