O Natal nos leva a voltar nossa atenção para o lugar em que Jesus nasceu e cresceu, e viveu a maior parte do seu tempo. A região da Galileia era uma periferia rural, que convivia com o drama da fome agravada pelos pesados impostos sobre o povo. Olhando para nossa realidade, também constatamos a melancólico realidade do Brasil com 33 milhões de pessoas que passam fome. É verdade que a pandemia da Covid-19 e a guerra na Ucrânia contribuíram, mas não justificam tal situação. Para bem vivermos o Natal, cabe a nós um exercício de conversão para o outro, que gere em nós compromisso cristão na busca de solução para a fome de pão, justiça, partilha e comunhão.
O Natal nos convida a refletir sobre a ação de Deus na vida das pessoas e sua manifestação entre os pobres, indicando caminhos para quem tem um coração compassivo com as necessidades dos que sofrem. Compadecer-se é padecer junto, é sentir por dentro, nas entranhas, a dor, o sofrimento do outro. A compaixão é essencial para o exercício do acolhimento e da partilha. Em Sarepta de Sidom, Elias foi acolhido pela viúva que, mesmo sabendo que não teria o que comer depois, – porque vivia o que conhecemos hoje como insegurança alimentar- repartiu com ele o pouco que tinha para ela e seu filho. A partir de então, não mais faltou alimento naquela lar, pois “Deus não deixa faltar nada aos que estão dispostos a repartir”.
Leiamos 1Rs 17,7–16: “Dar do pouco que se tem ao que tem menos ainda, enriquece o doador, faz sua alma ainda mais linda”, assim diz a canção. Deus se manifesta no meio dos pobres e necessitados dando a vida através do gesto capaz de repartir o pouco que se tem. O episódio da viúva de Sarepta nos recorda o texto de Mc 6, 30-44, quando os discípulos, obedecendo à ordem de Jesus, repartiram cinco pães e dois peixes com a multidão faminta. Obediente à ordem de Deus, a viúva repartiu com Elias o que era insuficiente para ela e o filho. Mesmo prevendo a possibilidade da fome e da morte, a confiança nessa ordem foi mais forte que suas dúvidas sobre o porvir.
Pela falta de chuva abateu-se uma forte seca na região onde Elias morava. Com isso, alastrou-se entre o povo a fome. Fato semelhante aconteceu conosco em razão da pandemia da Covid-19, quando muitos ficaram desempregados e não tinham como se sustentar. As famílias não tinham como prover suas necessidades básicas de sobrevivência. A doença ceifou muitas vidas, inclusive de pais e mães chefes de família. Isso gerou um grande mutirão de solidariedade para com os desvalidos, não só entre as pessoas, mas também entre organismos internacionais que se uniram em torno da fome espalhada pelo mundo. Houve também partilha de conhecimentos adquiridos por profissionais de saúde no trato dos doentes.
No início deste ano veio à tona o escândalo da fome e desnutrição entre o povo Yanomami. Houve aumento dos casos de malária e de outras doenças e mortes provocadas pela fome, pela falta de vacinas e medicamentos. Junte-se a isso o envenenamento de seus rios pelo uso de mercúrio no garimpo ilegal, a invasão de suas terras, a destruição de suas plantações pelos garimpeiros, usurpando seus já escassos alimentos. Vale lembrar os assassinatos de lideranças indígenas e também de pessoas que tentaram proteger seus direitos. Toda essa tragédia foi construída com altos investimentos financeiros visando a extinção do povo indígena, por pessoas movidas pela ganância, pela sede de poder.