Jesus Cristo, o Filho de Deus encarnado, é o Sumo e Eterno Sacerdote (cf. Hb 4,14-16). Seu sacerdócio único e perfeito se consumou no sacrifício redentor da Cruz, pelo qual ele se ofereceu a si mesmo para a salvação da humanidade, estabelecendo uma nova e eterna aliança com Deus.
Dom Edson Oriolo – Bispo da Igreja Particular de Leopoldina MG.
Na quinta-feira santa em muitas catedrais celebra-se a Missa dos Santos Óleos. É uma ocasião em que os óleos utilizados na administração dos sacramentos são abençoados e consagrado. Essa solenidade é considerada uma das principais manifestações para a compreensão do sacerdócio de Cristo e do ministério dos sacerdotes (cf. Prefácio Missa do Crisma).
O ministério sacerdotal do povo de Deus, do bispo e presbíteros (cf. LG 20-21) é o sacerdócio único e universal de Cristo, segundo a ordem de Melquisedec e não da classe sacerdotal de Levi, no povo de Israel. Portanto, esse acontecimento é expressão não só da unidade dos presbíteros com seu bispo, mas da Igreja diocesana como comunidade de comunidades.
Na celebração da missa da unidade, são abençoados o óleo dos catecúmenos, que será utilizado no sacramento do Batismo quando se unge o batizando no peito, e o óleo dos enfermos, que é conferido aos doentes, na fronte e nas mãos. Também é consagrado o santo óleo do Crisma. O Pontifical Romano ensina que “é com o santo óleo do Crisma, consagrado pelo bispo, que os recém-batizados serão ungidos e que os confirmados são marcados e recebem o dom do Espírito Santo” e os ordenados são consagrados ao serviço de Cristo na Igreja.
O óleo do Crisma unge a pessoa após receber a água no Batismo para participar da missão de Cristo, sacerdote, profeta e pastor. Também são ungidos com o óleo consagrado aqueles que recebem o sacramento da Confirmação e, ainda mais, os ministros ordenados, sendo os presbíteros ungidos nas mãos e os bispos na cabeça. O bálsamo misturado com o santo óleo faz com que este signifique a plenitude do Espírito Santo, revelando que o cristão deve irradiar “o bom perfume de Cristo”.
Sacerdócio de Cristo
Jesus Cristo, o Filho de Deus encarnado, é o Sumo e Eterno Sacerdote (cf. Hb 4,14-16). Seu sacerdócio único e perfeito se consumou no sacrifício redentor da Cruz, pelo qual ele se ofereceu a si mesmo para a salvação da humanidade, estabelecendo uma nova e eterna aliança com Deus. Ele é o mediador entre Deus e os homens, intercedendo continuamente por nós. Jesus é vítima e oferenda ao mesmo tempo, tornando-se o mediador indispensável para, por meio dele, alcançarmos a salvação e a reconciliação com Deus.
No entanto, todos nós participamos do sacerdócio de Nosso Senhor Jesus Cristo e fazemos parte da sua Igreja pelos sacramentos do Batismo, da Confirmação e da Ordem, que nos conferem, com o óleo do Crisma, um selo indelével, realizado pelo Espírito Santo. Esta configuração com Cristo e com a Igreja, realizada pelo Espírito, é indelével e permanece para sempre no cristão como disposição positiva para a graça, como promessa e garantia da proteção divina e como vocação ao culto divino e ao serviço da Igreja. Por isso, estes sacramentos nunca podem ser reiterados (cf. CIC 1121).
Todo aquele que recebe um sacramento que imprime caráter participa, por isso mesmo, do sacerdócio de Jesus Cristo. Essa participação começa no batismo, aperfeiçoa-se na confirmação e para alguns chega a máxima plenitude no sacramento da ordem.
Sacerdócio Batismal e o Sacerdócio Ministerial
O sacerdócio batismal e o sacerdócio ministerial ou hierárquico, embora distintos, ordenam-se um ao outro. Embora diferentes na essência e não apenas em grau, estão interligados, participando cada um à sua maneira do único sacerdócio de Cristo (cf. LG 10). No entanto, o Catecismo da Igreja Católica reforça essa distinção essencial, afirmando que, embora ambos os sacerdócios constituam duas formas de participação no único sacerdócio de Cristo, eles se distinguem não só em grau, mas essencialmente (cf. CIC 1591). O sacerdócio ministerial, por meio do sacramento da ordem, serve ao sacerdócio batismal, permitindo que os sacerdotes atuem em nome de Cristo, oferecendo o sacrifício eucarístico e guiando o povo de Deus.
O Sacerdócio Batismal
O sacerdócio batismal se realiza no desenvolvimento da graça batismal: vida de fé, esperança e de caridade, vida segundo o Espírito (cf. CIC 1547). É fruto dos sacramentos do batismo e da confirmação, e difere-se essencialmente do sacerdócio ministerial, fruto da consagração realizada pelo sacramento da ordem. Todos os fiéis, pelo batismo e pela confirmação, participam do sacerdócio de Cristo, enquanto há um sacerdócio ministerial instituído pelo próprio Cristo a serviço do povo de Deus. É uma participação muito real e verdadeira do sacerdócio de Jesus Cristo, e não se trata de atribuir aos leigos poderes e prerrogativas que eles, na verdade, jamais exerceram em toda a história.
O sacerdócio batismal é um aspecto vital da vida da Igreja, que nos lembra que todos os batizados têm um papel a desempenhar na missão de Cristo. Todos os batizados participam da missão sacerdotal de Cristo, e os leigos têm uma responsabilidade na vida da Igreja. Cada fiel contribui de forma própria para a edificação do Corpo de Cristo. “Os batizados, pela regeneração e unção do Espírito Santo, são consagrados como lar espiritual e um sacerdócio santo” (LG 10)
Vivência do Sacerdócio Batismal
No entanto, podemos pensar a vocação e a participação ativa dos fiéis cristãos, na Igreja, considerando três pilares fundamentais para viver o sacerdócio batismal:
a) Os fiéis são chamados a oferecer suas orações e ações como sacrifícios espirituais. “Todos as suas obras, orações e esforços apostólicos, vida familiar e profissional, se tornam sacrifícios espirituais aceitáveis a Deus” (LG 34)
b) Os leigos têm a responsabilidade de ser testemunhas de Cristo no mundo, promovendo a mensagem do evangelho por suas vidas e ações. “A missão da Igreja é a salvação dos homens, que deve ser alcançada pela fé em Cristo e pela sua graça” (…) “Brilhe vossa luz para que vendo vossas obras, glorifiquem o Pai que está nos céus” (Mt 5,16) (AA,6)
c) Nas celebrações litúrgicas os fiéis participam, oferecendo-se junto com o sacrifício de Cristo. “A participação na liturgia é um momento privilegiado onde o sacerdócio comum se torna visível e eficaz” (LG 11)
Assim sendo munidos das graças dos sacramentos do batismo e da confirmação, existe uma participação muito real e verdadeira no sacerdócio de Cristo pela oração, pelo testemunho e pela participação na liturgia. Vivencia-se o sacerdócio batismal na família e na participação comprometida e ativa na comunidade paroquial e eclesial missionária, empregando os dons e carismas pessoais.
O Sacerdócio Ministerial
O sacerdócio ministerial é ordenado ao serviço do sacerdócio batismal, que todos os batizados compartilham. O sacerdócio ministerial é um meio pelo qual Cristo continua a edificar e guiar a sua Igreja, sendo transmitido pelo sacramento da ordem (CIC 1591). Ele é essencial para a vida da Igreja, pois é por ele que a presença de Cristo se torna real e acessível aos fiéis. Os ministros ordenados são instrumentos da graça divina, permitindo que a comunidade experimente a salvação e a santidade de Deus.
O sacerdócio ministerial é um chamado a uma configuração mais essencial ao sacerdócio de Cristo, tornando presente, de maneira sacramental, o sacerdócio do próprio Cristo. Todo agir ministerial é agir ministerial do próprio Cristo e ajuda os cristãos a crescerem na fé e na união esponsal com Deus.
O Concilio Vaticano II, para melhor esclarecer o tema do sacerdócio, faz todo um estudo sobre o sacerdócio do batismo e o sacerdócio ministerial. Afirma que com o sacerdócio ministerial, todo ele ligado ao sacramento da ordem, pelo homem recebe, pela Igreja e para a Igreja, o múnus de santificar, ensinar e governar o povo de Deus de forma ordinária. Considera, também, que pelo batismo, o cristão, participando do sacerdócio comum, é constituído sacerdote, profeta e rei para exercer vários ministérios de forma extraordinária para o bem do mesmo povo de Deus.
Compromissos do Sacerdócio Ministerial
As principais funções do sacerdócio ministerial incluem a celebração dos sacramentos, especialmente a eucaristia, que é o centro da vida da Igreja. Na celebração da missa, o ministro ordenado representa a comunidade diante de Deus e oferece a oração da Igreja (cf. CIC 1552). Além da celebração dos sacramentos, é chamado a guiar espiritualmente a comunidade, oferecendo o ensino da Palavra de Deus, orientando para agir em conformidade com projeto do Pai e cuidando das necessidades pastorais dos fiéis. Em razão do ministério, os ministros ordenados são chamados a ser pastores, educadores e celebrantes, sempre agindo em nome de Cristo e da Igreja.
Conclusão
A vida da Igreja reside na compreensão e na vivência da complementaridade intrínseca entre o sacerdócio comum dos fiéis, conferido pelo Batismo, e o sacerdócio ministerial, instituído pelo sacramento da Ordem. Não podemos, sob pena de enfraquecer o Corpo Místico de Cristo e de obscurecer a sua missão no mundo, negligenciar ou diminuir a participação ativa e responsável de cada batizado na obra da evangelização. Da mesma forma, não se pode absolutizar o sacerdócio ministerial, deixando os fiéis leigos numa posição passiva e meramente executora, desvirtuando a rica diversidade de dons e carismas que o Espírito Santo derrama sobre o povo de Deus.
Pelo sacramento da Ordem, os ministros sagrados são chamados a uma configuração mais profunda com Cristo Sacerdote, Pastor e Servo, comprometendo-se de maneira singular com a busca da santidade. Como nos adverte São Pio X, a santidade de vida é o fundamento da autenticidade e da fecundidade do ministério sacerdotal. É a íntima amizade com Jesus Cristo, nutrida pela oração constante, pela participação nos sacramentos, especialmente na Eucaristia e na Penitência, e pela contemplação da sua Paixão, que molda o ministro ordenado, segundo o coração de Deus.
Neste contexto, torna-se imperativo combater vigorosamente a secularização que pode contaminar a vida dos padres, afastando-os da centralidade de Cristo e das necessidades espirituais do rebanho. Da mesma forma, a clericalização dos leigos, que os induz a assumirem funções e mentalidades próprias do ministério ordenado, obscurece a sua vocação específica de testemunhar Cristo nos diversos âmbitos da sociedade.
No entanto, a superação desses desvios passa pela redescoberta da beleza e da exigência da vocação de cada batizado. Os leigos são chamados a exercer o seu sacerdócio batismal pelo testemunho de uma vida santa no matrimônio, na comunidade paroquial e eclesial missionária, na família, no trabalho e no cuidado com os mais vulneráveis, impregnando as realidades temporais com o espírito do Evangelho. Os ministros ordenados, por sua vez, fortalecidos pela graça sacramental e pela busca incessante da santidade – uma santidade interior ainda mais exigente para aqueles que servem a Cristo no altar, como nos ensina Santo Tomás de Aquino – devem ser modelos de fé, esperança e caridade, dedicando-se integralmente ao serviço do povo de Deus, guiando-o no caminho da santificação e da união esponsal com o Pai.
Concluindo, a Igreja, consciente da riqueza e da complementaridade dos seus sacerdócios, deve promover uma pastoral que valorize e articule a participação de todos os seus membros na missão evangelizadora. Somente assim, fortalecida pela santidade do clero e pelo testemunho vibrante dos seus fiéis, poderá combater eficazmente a secularização e a clericalização, irradiando a luz de Cristo em um mundo sedento de sentido e de esperança. Assim podemos dizer que estamos vivenciando o “ano jubilar de esperança”.