Dom Oriolo: “nos tempos atuais, temos de usar de todos os recursos para vivenciar e proclamar a Palavra de Deus”.
Dom Oriolo Bispo da Igreja Particular de Leopoldina MG
A Inteligência Artificial Generativa (IAG), desde 2020, representa um avanço imenso no campo da inteligência artificial (IA), indo muito além da simples automação. Ao invés de apenas processar informações existentes, a IAG é capaz de criar conteúdo original, em diversas formas, como textos, códigos de programação, imagens, áudios e vídeos. Essa capacidade da IAG é única tornando uma ferramenta verdadeiramente transformadora, impactando profundamente as pessoas e todos os setores da sociedade em escala global.
Nos tempos atuais, temos de usar de todos os recursos para vivenciar e proclamar a Palavra de Deus. O desafio que temos é aprender a como usar dos recursos da técnica digital para proclamar a Palavra de Deus de modo a provocar a sua vivência. Eis a sublime missão da Igreja! É o anúncio da Boa-Nova que reúne os fiéis (cf. LG 26; PO 4), na dinâmica da Igreja doméstica. Somos impelidos a ser ousados e criativos na evangelização. A Palavra de Deus anunciada, escutada, meditada e encarnada na vida das pessoas é a origem e o princípio das comunidades paroquiais e eclesiais missionárias, que têm como centro e ponto culminante a Eucaristia (cf. CD 30).
A Exortação Apostólica sobre Evangelização no Mundo Contemporâneo (EN), n. 40 afirma: “A importância do conteúdo da evangelização não deve esconder a importância das vias e dos meios da mesma evangelização. O problema de ‘como evangelizar’ apresenta-se sempre atual, porque as maneiras de o fazer variam em conformidade com as diversas circunstâncias de tempo, de lugar e de cultura, e, por isso mesmo, lançam, de certo modo, um desafio à nossa capacidade de descobrir e de adaptar”.
A mesma Exortação afirma que “nunca será possível haver evangelização sem ação do Espírito Santo (…). É um fato que o Espírito Santo de Deus tem um lugar eminente em toda a vida da Igreja, mas, é na missão evangelizadora da mesma Igreja que ele mais age (…). As técnicas da evangelização são boas, obviamente, mas, ainda as mais aperfeiçoadas não poderiam substituir a ação discreta do Espírito Santo. A preparação mais apurada do evangelizador nada faz sem ele. De igual modo, a dialética mais convincente, sem ele, permanece impotente em relação ao espírito dos homens. E ainda os mais bem elaborados esquemas com base sociológica e psicológica, sem Ele, em breve se demonstram desprovidos de valor” (EN 75).
Destarte, o magistério da Igreja, ciente da crescente relevância da IA, reconhece que essa tecnologia, embora prometa ampliar a criatividade e a eficiência, e até mesmo auxiliar na dinâmica da evangelização, também acende uma alerta. Papa Leão XIV já expressou preocupação com o potencial da IA, de comprometer a dignidade humana, a justiça e o trabalho. A Igreja Católica tem se dedicado a refletir sobre os impactos da IA enfatizando a importância de garantir que o progresso tecnológico não comprometa os valores fundamentais. Se por um lado, a IA pode ser uma ferramenta poderosa, oferecendo novos caminhos para a propagação da fé criando textos, códigos, imagens, áudios e vídeos, por outro lado surge a preocupante questão dos perigos que IAG pode trazer no campo da evangelização.
A IAG oferece um potencial imenso para ajudar a compartilhar e espalhar o Evangelho através de conteúdos, imagens, áudios, vídeos, códigos. No entanto, é crucial que seu uso não resulte na banalização do conteúdo religioso online. As ferramentas de IAG devem preservar a profundidade e a sacralidade do Evangelho, evitando a superficialidade que pode surgir da interação humana com a IA (prompts). Tal superficialidade pode desviar do comprometimento dos fiéis em participar nas suas comunidades paroquiais e eclesiais missionárias.
O conteúdo fundamental da evangelização é Jesus Cristo e Sua revelação sobre Deus, configurando, assim, uma experiência de fé. No entanto, a IAG pode ser uma ferramenta auxiliar valiosa quando aplicada na reflexão teológica, no esclarecimento doutrinal, no planejamento pastoral, na proposta ética ou na prática religiosa. É relevante notar que a IAG tende focar em uma ética comportamental, em vez de promover um aprofundamento ético quanto aos valores e seus conflitos em situações concretas. Contudo, seu uso, quando explicitamente reconhecido, demostra honestidade intelectual.
A principal preocupação reside no risco de que a busca por reações imediatas e o foco em métricas, ao utilizar a IAG para criar, gerar, escrever, resumir, desenhar, responder e falar sobre ideias e conteúdos para evangelização, possam levar à manipulação. Isso pode resultar em respostas superficiais ou desalinhadas com os princípios éticos e teológicos da fé, um problema já perceptível nos resultados de muitos prompts.
Assim sendo, devemos ter a consciência de que o uso da IAG como técnica para ajudar a lançar as sementes do Verbo requer muita cautela. A verdadeira evangelização vai além da automação e da otimização algorítmica, ela se enraíza na ação discreta, mas poderosa, do Espírito Santo.