Impunidade, insegurança pública, tolerância para com as injustiças: é o clima difícil que se respira no Malawi e que a Comissão Episcopal de Justiça e Paz (CCJP) denuncia numa declaração divulgada nesta terça-feira, 27 de outubro.
Cidade do Vaticano
“Estamos horrorizados – lê-se na nota – com a falta de respeito à lei, a insegurança pública sobretudo em relação aos membros mais vulneráveis da sociedade, e com a tolerância com a qual se olha para as injustiças sociais profundas e de longa data no País”.
Em particular, a CCJP aponta o dedo contra a “indiferença para com a protecção da sacralidade da vida, no que se refere à protecção das pessoas mais frágeis e a promoção do bem comum”. E não só: os prelados também lamentam a “crescente violência perpetrada pelo crime organizado e do aumento da feitiçaria e dos homicídios rituais” de que são vítimas, de maneira particular, as “jovens raparigas”, com o consequente aumento “de adolescentes grávidas e os casamentos prematuros”. Tudo isso, prossegue a declaração, não apenas denota “um defeito intrínseco no sistema que deveria proteger os direitos” das categorias sociais mais vulneráveis, mas também é “uma clara manifestação de que os responsáveis não estão fazendo o suficiente para proteger estes grupos vulneráveis”.
Falta de vontade política para soluções a ataques e sequestros
“É preocupante – continua a CCJP – a falta de vontade política para instituir soluções duradouras que travem os ataques, assassinatos, sequestros e ameaças contra os albinos”, tanto que “para além da retórica política, não se notam acções concretas por parte do governo para combater tais pragas”. Mas isto, sublinham os prelados, “equivale a revogar o dever do Estado de proteger os seus cidadãos”, porque “pouco se está a fazer para remediar as carências do sistema de justiça penal”, para “combater de forma adequada o crime”. Como exemplo flagrante da gravidade da situação actual, a Comissão de Justiça e Paz cita “a profanação do cadáver de um albino em Ntcheu, a horrenda violação de uma menor em Chikwawa e o assassinato implacável de uma senhora idosa em Dedza, acusada de feitiçaria”.
Corrupção desenfreada na liderança do País
Na base desta “insensibilidade generalizada perante as injustiças sociais – lê-se ainda na declaração – está a corrupção desenfreada na liderança do País”: um sistema corrupto, de facto, “é apoiado pela elite governamental” e se “não for interrompido em breve, vai se tornar a norma”. Pelo contrário, a população é contra a corrupção porque sabe que ela “é um terreno fértil” para a impunidade e o enriquecimento de poucos, “enquanto a maioria continua mergulhada na pobreza”.
Daí o convite a “investigar e suspender efectivamente” os funcionários do governo corruptos, sem conceder favoritismo e nem tratar as “desigualdades e injustiças sociais” por meio de “declarações políticas, em vez de acções judiciais”. A este respeito, a Comissão de Justiça e Paz sublinha que “a maioria dos pobres no Malawi não consegue ter acesso à terra e tem problemas para se beneficiar dos programas de empréstimos públicos devido à corrupção e o nepotismo” dentro do governo.
Resultados palpáveis no combate à violência baseada na feitiçaria
O convite é, pois, a praticar “um maior controle”, caso contrário “a situação pode degenerar em violências mafiosas, o aumento da ilegalidade, a radicalização das desigualdades socioeconómicas e de uma crescente desconfiança dos cidadãos em relação aos seus líderes”. Nesta óptica, os bispos pedem às forças da ordem e segurança e ao sistema judiciário “resultados palpáveis no combate à violência baseada na feitiçaria, os assassinatos rituais e nas agressões, bem como o estupro e a profanação de jovens meninas”, e apelam às instituições competentes para “intensificarem os esforços para aumentar a consciência da sociedade sobre os direitos dos grupos vulneráveis”.
Enfrentar problema do acesso à terra de forma holística
Além disso, para erradicar definitivamente a corrupção, a Igreja Católica no Malawi exorta o Escritório do País para a Anticorrupção a “investigar e processar as pessoas que se acredita terem cometido” tais crimes. Um último apelo, enfim, é lançado pela Comissão Episcopal de Justiça e Paz para que o governo “enfrente o problema do acesso à terra de forma holística, através de uma lei participativa, uma política justa e uma reforma das instituições”.