Quando Maria retornou grávida da visita à sua prima Isabel, José pensou em abandoná-la, ao invés de vê-la apedrejada, conforme a lei daquela época autorizava. Ele poderia até ter cometido feminicídio, mas não o fez, pois era justo e temente a Deus. Quando o anjo lhe disse em sonho que Maria concebeu um filho sob a ação do Espírito Santo, José a acolheu e a levou para Belém, para o grande censo ordenado por César Augusto. Aos olhos de qualquer um, Maria teria traído José com outro homem, mas, como nem tudo o que parece é, foi pelo acolhimento incondicional e pelos cuidados de José, que Maria pôde realizar o plano de Deus para a nossa salvação. Cumprir a lei é essencial para a vivência harmoniosa em sociedade, mas a lei deve ser executada a fim de que a justiça seja feita. Se José tivesse cumprido cegamente à letra da lei, Maria teria morrido apedrejada antes de dar à luz. Ele renunciou a sua vontade e aceitou a de Deus; respeitando-a, cuidou dela e de Jesus. José foi misericordioso e justo, mesmo quando o que parecia ter sido uma traição, na verdade, era o plano de Deus, para a salvação da humanidade.
“…O Senhor não vê como o homem: o homem vê a aparência, mas o Senhor vê o coração.” (1Sm 16, 7). As aparências podem enganar. Por isso, é fundamental ver o que está dentro do coração de cada um. Quando Jesus estava machucado e pregado na cruz, mesmo desfigurado, ele revelou seu imenso amor por nós, provando que quem sente dor também é capaz de amar. E o verdadeiro amor é muito maior do que as aparências, porque esse amor se encontra no íntimo de nosso ser. O que os outros pensam de nós, a partir de nossa aparência física, não demonstra nosso real valor. Deus vê o que está oculto, nossa personalidade e motivações, o que pensamos e fazemos, nossas angústias e esperanças. Ele é justo, fiel e misericordioso, e nos pede para praticar o direito e a justiça, a fim de que efetivamente melhoremos a condição de vida dos outros, não simplesmente para sermos vistos como legalistas radicais. Somos seguidores de Cristo, mas nem sempre nossas verdadeiras intenções são cristãs, apesar de fazermos com que pareçam ser. Um vírus invisível desencadeou uma pandemia e vem causando muito estrago mundo afora. É momento de nos unir em oração, de socorrer os que estão sem alimento e medicação, de promover dignidade aos menos favorecidos, a fim de que todos sejamos capazes de atravessar essa problema com decência e fé. Nesta pandemia, mesmo com todas as dificuldades, ainda tem gente que acha que o momento é para superfaturar o preço dos mantimentos e insumos necessários e para combater o corona vírus. Lamentável!
Em virtude da pandemia, quando alguns prefeitos fecharam o comércio em março, a lei permitiu aos empregadores o direito de antecipação de férias individuais aos empregados, desde que negociassem, ainda que o período aquisitivo a elas relativo não tenha transcorrido, para que minimizem os gastos e mantenham os empregos. Sinceramente, para onde eles iriam, num momento como este? Alguns foram comunicados de que estavam de férias, sem qualquer consulta ou negociação. Férias são para serem gozadas em lazer, passeios, viagens ou mesmo em lar, mas desde que se possa sair e se divertir. A lei permitiu, mas o patrão que concedeu férias aos funcionários, especialmente sem com ele negociar, quando tudo estava fechado, o fez pensando unicamente no seu ganho financeiro de empregador, e não no bem-estar do trabalhador, que é quem realmente faz a economia girar, com seu suor diário. O governo concedeu outras ações ao setor empresarial, a fim de atenuar a crise, como suspensão do recolhimento do FGTS de março, abril e maio, para que, economicamente, não houvesse tanto impacto. Porém, o patrão preferiu cortar na carne mais fraca, que é a do trabalhador, retirando-lhe o direito de negociar suas férias. “Ai de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês são como sepulcros caiados: bonitos por fora, mas por dentro estão cheios de ossos e de todo tipo de sujeira. Assim são vocês: por fora parecem justos ao povo, mas por dentro estão cheios de hipocrisia e maldade” (Mt 23, 27-28).
“Você pode enganar a todos algum tempo; a alguns, todo o tempo; mas não pode enganar a todos todo o tempo!” (Abraham Lincoln) As aparências têm tanto poder de enganar, que nem Maria Madalena reconheceu Jesus, após a ressurreição. Os discípulos de Emaús andaram com ele e só o reconheceram no partir o pão. As aparências efetivamente enganam… O Corpo de Cristo parece, mas não é um pedaço de pão; o Sangue de Cristo parece, mas não é um copo de vinho. Eles são alimentos para o nosso espírito, para a nossa salvação. É relevante pedirmos a Deus que nos dê sabedoria e discernimento, porque é muito fácil sermos enganados, iludidos e persuadidos a andar por caminhos que não conduzem à plenitude da vida. Não podemos nos deixar levar pelo que é falso, uvidoso ou ilusório, nem nos deixar amedrontar por pregações, conceitos ou filosofias que nos enganam e nos desviam de Jesus Cristo, único Salvador e Senhor da nossa vida. Há incertezas nesta vida, por isso precisamos buscar a sabedoria que vem do alto, de Deus, para que testemunhemos e preguemos o Cristo crucificado. Dessa forma, o maligno jamais poderá enganar quem têm olhos espirituais e enxergam através da fé. Que saibamos reconhecer Jesus no irmão, na Palavra, na Eucaristia e dentro de nós mesmos. Às vezes, pode não parecer, mas Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida, que nos leva ao Pai.
Por Fabiana de Deus