Núncio Cavalli: “Venha a Medjugorje, lugar de graça escolhido pelo Senhor”

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Entrevista com o arcebispo Aldo Cavalli, enviado pelo Papa Francisco à paróquia das supostas aparições: é ele quem lê antecipadamente as mensagens atribuídas à “Rainha da Paz” e a autorizar sua publicação

Andréa Tornielli

«Medjugorje é um lugar normal, sem nada de especial e, pela graça, tornou-se um lugar espiritual para onde vêm pessoas do mundo inteiro. Chegam e começam a rezar.” A afirmação, em entrevista à mídia vaticana, é do arcebispo Aldo Cavalli, 78 anos, natural de Lecco, Itália, com uma vida dedicada ao serviço da Santa Sé nas nunciaturas, e que em novembro de 2021 foi enviado pelo Papa Francisco como visitador apostólico ao pequeno país da Bósnia e Herzegovina, que nos últimos quarenta anos se tornou um dos centros marianos mais visitados do mundo.

2024 foi um ano relevante para Medjugorje: em maio passado, o Dicastério para a Doutrina da Fé publicou novas normas sobre supostos fenômenos sobrenaturais que facilitam a autorização para a devoção sem comprometer a Santa Sé na declaração de sobrenaturalidade. E em setembro foi divulgada a nota intitulada “A Rainha da Paz”, dedicada à experiência espiritual de Medjugorje, que concede ao fenômeno mariano o “nulla osta”, ou seja, o mais alto reconhecimento entre os previstos pelas novas normas. Desde então, as “presumíveis mensagens” que os videntes recebem são publicadas «com aprovação eclesiástica».

Já há alguns anos o senhor vive na paróquia de Medjugorje e encontra peregrinos. Como tem sido a sua experiência?

Eu nunca tinha estado em Medjugorje. Mas eu sou italiano e, como muitas pessoas do meu país, tive contato com aqueles que vieram para cá. Sempre percebia, quando retornavam de Medjugorje, que essas pessoas ficavam mais comprometidas em nível espiritual e humano: na igreja, nas catequeses, em fazer o bem. Eram muito mais comprometidas do que antes. Agora já estou aqui há três anos: é um lugar normal, sem nada de especial e, pela graça, se tornou, um lugar espiritual para onde vêm pessoas do mundo inteiro. Elas chegam começam a rezar. Elas entram em comunhão com o Senhor Jesus e a Virgem Maria os acompanha. É uma oração simples: querem mudar de vida, viver melhor do que antes, querem resolver ou enfrentar bem os problemas que têm. Uma mudança que se chama conversão, que ocorre em particular no Sacramento da Penitência. Isso acontece normalmente em Medjugorje.

Olhando para os tantos peregrinos que chegam, o que mais lhe chama a atenção?

Chegam jovens e adultos, sem nenhum patrocínio. Chegam todos com um objetivo: achar o Senhor e a Virgem Maria. Eles não encontram nada para ver ou visitar: como turismo religioso, somos zero. Mas aqui, jovens e adultos começam a rezar. Eu tinha acabado de chegar, em fevereiro de três anos atrás, e me vi entre os bancos ao ar livre atrás da igreja. Chega uma família latino-americana, com um jovem de quinze anos que era um rebelde, um verdadeiro rebelde! Depois de apenas cinco minutos ele veio se confessar… e seus pais o olhavam com surpresa. É um lugar de graça que o Senhor escolheu para ser encontrado. O ‘nulla osta’ do Papa significa dizer: ide, ide, ide! Ide porque é um lugar de graça, onde se encontra o Senhor e o Senhor é encontrado.

Graças às novas normas desejadas pelo Papa Francisco, agora o procedimento para examinar e pronunciar-se sobre esses casos se concentra mais nos frutos espirituais.

O Dicastério para a Doutrina da Fé examinou dois pontos que são documentáveis. O primeiro diz respeito aos frutos. Em Medjugorge chegam milhares e milhares de pessoas do mundo inteiro. Neste ano vieram dois milhões de pessoas, adultos e jovens. Quase 50.000 padres vieram para rezar, para se converter. Depois, outros frutos muito importantes são as muitas vocações. Tantas pessoas que rezam. O segundo elemento examinado foram as mensagens. Cada mensagem foi confrontada com a nossa fé e descobriu-se que as mensagens correspondem a ela. Frutos muito positivos e mensagens positivas para a fé: isso permitiu dizer que Medjugorje é um lugar de graça.

O senhor está pessoalmente envolvido na publicação das mensagens que são divulgadas uma vez por mês. O que acontece concretamente?

É muito simples: quando há uma mensagem, a pessoa que a recebeu a escreve e me envia na língua em que escreve, que é o idioma croata. E imediatamente a traduzem para mim para o italiano. Este processo é muito interessante: há pelo menos duas mediações humanas muito importantes: por isso que falamos sempre de “supostas mensagens”, mesmo que sejamos a favor, a ponto de, no final da mensagem, escrevermos: “Com aprovação eclesiástica”. Mas atenção, as mensagens são definidas como “presumíveis” porque passam por duas mediações humanas: não é Nossa Senhora que as escreve, escreve quem as recebe. A segunda mediação é a tradução do croata para o italiano: são duas línguas totalmente diferentes. Nós dizemos que a mensagem é boa, que corresponde à fé e convidamos a lê-la e meditá-la sobre porque é positiva. Não acrescenta nada à Revelação, mas a enriquece. Ajude a viver melhor a fé hoje.

Sabemos que nenhuma revelação privada, portanto nenhuma das aparições marianas, acrescenta algo à Revelação. Que atitude devemos ter e que riscos evitar? Porque às vezes há o risco de deixar-se tomar por um excesso de curiosidade pelos “segredos”, uma curiosidade um tanto apocalíptica.

Em maio passado, o Dicastério para a Doutrina da Fé publicou as normas que são fundamentais para entender a decisão sobre Medjugorje. Recordou que antes de tudo a Revelação, a Palavra de Deus, é somente a Bíblia e que essa Revelação se concluiu com o Apocalipse. Isso não significa que o Espírito Santo não possa fazer uso de mensagens e revelações privadas confiadas às pessoas e que servem para melhor concretizar a única Revelação verdadeira. Tudo isso não acrescenta nada à Revelação, mas pode ser útil. Eis a importância das mensagens. Podem ser úteis para cumprir hoje a Revelação que o Senhor fez de uma vez por todas.

O senhor conheceu os videntes de Medjugorje? Encontrou-os?

Sim. E posso dizer que são pessoas simples, têm família, têm os problemas que toda família tem.

Desculpe-me se lhe interrompo: alguém levantou uma objeção pelo fato de que nenhum deles se tornou padre ou freira…

Mas cada um tem sua vocação! São pessoas simples, pessoas boas. Não tenho nada a dizer. Nós nos vemos com assiduidade e tomamos café juntos. São pessoas que crescem na fé, cada uma à sua maneira, e se tornam mais sábias, cada vez mais sábias. Estou em contato com eles: eles não se tornaram padres ou freiras e cada um tem sua própria missão, sua própria vida familiar.

O que o  senhor aprendeu nesses três anos na paróquia de Medjugorje?

Que aqui existe a graça. Aprendi que o Senhor, com sua graça, nos acompanha sempre. Aprendi que o Senhor tem um plano para nossa vida e nos acompanha. Ele nos ama.

Em Medjugorje, Nossa Senhora se apresentou como a “Rainha da Paz”. Uma mensagem que é mais relevante do que nunca em nosso tempo.

Uma das primeiras supostas mensagens, em 1981, é muito profunda a esse respeito. Diz: paz, paz, paz, que reine a paz. Atenção: não entre nós, mas antes de tudo entre Deus e nós, e depois também entre nós. Isso é fundamental. Quando os judeus saíram do Egito, Deus disse por meio do profeta Moisés: se quiserem viver livres, há algumas regras a serem seguidas, são os Mandamentos. Deus é fundamental para a paz. Nos mandamentos nos são ditas poucas coisas para viver: respeitar a vida e não matar, a família é um ponto de referência fundamental, respeitemo-nos uns aos outros. Se vivermos assim, viveremos em paz. Se ao invés disso não vivermos assim, haverá guerras.

Outra característica que torna particularmente atual a mensagem de Medjugorje é o fato de que a presumível aparição ocorreu em uma terra onde coexistem diferentes religiões e que foi marcada em tempos recentes por uma violência terrível. Há mensagens que abordam esse tema. O que o senhor poderia nos dizer a este respeito?

A palavra que usamos é colóquio. Dia logos, colóquio entre nós, mas logos significa: apresento a ti a minha identidade, apresento a ti o meu modo de viver, de pensar, de acreditar, de fazer. E tu me apresentas a tua identidade. Dialogando, nos conhecemos, cada um mantendo a sua identidade. Se perdermos a identidade, não dialogamos mais. E então vem a tragédia. Lá existem diversas religiões, diferentes modos de viver. Devemos dialogar. E em Medjugorje temos uma identidade clara: o Senhor Jesus Cristo é o único Senhor para nós.

As novas normas publicadas em maio passado pelo Dicastério para a Doutrina da Fé são uma expressão do espírito pastoral do Papa Francisco e correspondem à atitude de grande atenção à fé da devoção simples e popular. Quão relevante é esse aspecto?

Devemos colocar pontos de referência de fé muito fortes. A fé popular se enriquece colocando como ponto de referência a Mãe de Deus, e ponto de referência absoluto o Senhor Jesus Cristo. A Mãe de Deus que te acompanha para este encontro. Quando as pessoas simples chegam com todos os seus problemas, elas encontram a Mãe de Deus que sofreu como elas. A imagem de Nossa Senhora das Dores está em quase todas as paróquias: ela que sofreu como tu, e te acompanha até o Senhor Jesus que te dá forças para viver bem. Mudar de vida não é deixar a família, deixar o emprego… quando retornas à vida de antes, te transformastes por dentro. Sabes que com o Senhor é possível enfrentar problemas. Eis a fé dos simples. Eis o Rosário, a Eucaristia e a Adoração Eucarística. No verão passado, tive diante de mim 30/40.000 jovens que estavam em adoração, em silêncio absoluto. Ali, naquele pão transformado, está a presença real e substancial do Senhor Jesus Cristo. Ele olha para mim, eu olho para ele, ele fala comigo, eu falo com ele. Quantas pessoas me disseram: Ouvi o Senhor que falou comigo.

Pelo que o senhor contou e pelo que lemos na Nota do Dicastério sobre o fenômeno de Medjugorje, poderias concluir dirigindo um convite a todos para fazer esta peregrinação?

O documento diz claramente: ide a Medjugorje porque é um lugar de graça.

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