O Sínodo em oração pelos migrantes: a Igreja lar que acolhe a todos

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A questão da migração no centro do briefing na Sala de Imprensa vaticana. Na noite desta quinta-feira, após a 13ª Congregação Geral, os participantes, juntamente com o Papa, se reúnem na Praça de São Pedro, perto do monumento Angels Unawares, para rezar por aqueles que perderam suas vidas ao longo das rotas, pelos familiares, sobreviventes e refugiados. Czerny: “A harmonia e a boa vontade no Sínodo destacam a ansiedade, a vulnerabilidade e a marginalização de tantos migrantes”

Vatican News

A leitura da Palavra de Deus, o silêncio da reflexão, as intercessões e o Pai-Nosso marcam esta noite, 19 de outubro, o momento de oração com o qual a comunidade do Sínodo abraça os migrantes e os refugiados, desde o início da Assembleia no centro das discussões e das preocupações.  O encontro desta noite tem “um caráter universal” para compreender as tragédias das diferentes guerras, incluindo as mais “desconhecidas”, no estilo do “caminhar juntos” sinodal da Sala Paulo VI em direção ao monumento simbólico na Praça de São Pedro.

Participação e autoridades

Durante o briefing da tarde desta quinta-feira (19) na Sala de Imprensa vaticana, Paolo Ruffini, prefeito do Dicastério para a Comunicação e presidente da Comissão para a Informação, expôs em que ponto se encontram os trabalhos na Sala Paulo VI. Na tarde de quarta-feira na manhã desta quinta-feira, disse ele, foram realizadas a décima e a décima primeira sessões dos Círculos Menores, com um tempo dedicado ao “colóquio no Espírito”. A reflexão, no momento, diz respeito à seção B 3 do Instrumentum laboris: os 35 Círculos Menores estão discutindo os diferentes pontos seguindo o tema geral “Participação, tarefas de responsabilidade e autoridade. Quais processos, estruturas e instituições em uma Igreja sinodal missionária?”

Além disso, o prefeito lembrou – como foi divulgado na quarta-feira pelo cardeal relator geral Jean-Claude Hollerich – que “foram criados três grupos de trabalho de especialistas teólogos e canonistas que compartilharão com as Congregações Gerais, em três relatórios, suas reflexões sobre os pontos” do Instrumentum laboris B 3.3 (“Que estruturas podem ser desenvolvidas para consolidar uma Igreja sinodal missionária?”), B 3.4 (“Como podem ser configuradas as instâncias de sinodalidade e colegialidade envolvendo agrupamentos de Igrejas locais?”) e B 3.5 (“Como pode a instituição do Sínodo ser fortalecida para que seja uma expressão de colegialidade episcopal no seio de uma Igreja totalmente sinodal?”). Por sua vez, Sheila Pires, secretária da Comissão para a Informação, divulgou que na tarde de quarta-feira 340 pessoas participaram dos trabalhos, e na manhã esta quinta-feira, 344. E compartilhou que na Sala, justamente em um clima de sinodalidade, comunhão e fraternidade, os aniversários e datas comemorativas são pontualmente lembrados.

Cardeal czerny: com as pessoas mais vulneráveis da Terra

O cardeal Michael Czerny, prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, referiu-se em sua intervenção em inglês à oração pelos migrantes programada para a noite desta quinta-feira na Praça de São Pedro. Diante da escultura Angels Unawares – explicou – “a assembleia sinodal, que está aprendendo a caminhar junto como Igreja, terá a oportunidade” de tornar visível, de forma simbólica, “esse caminho” feito junto “com algumas das pessoas mais vulneráveis da Terra, especialmente aquelas que estão fugindo ou são forçadas a deixar” sua terra natal, ou seja, “aqueles que chamamos de migrantes e refugiados”.

Portanto, acrescentou, “haverá uma harmonia com a maneira como estamos passando esse dia” na assembleia sinodal “falando sobre alguns aspectos” do fenômeno da migração diante da embarcação  esculpida em bronze por Timothy Schmalz, que representa “pessoas de todas as idades que foram forçadas por algum motivo a fugir de seu país e de suas casas”. No entanto, observou Czerny, “a harmonia e a boa vontade e o profundo intercâmbio experimentado no sínodo” destacam dramaticamente “a ansiedade, a falta de segurança, a vulnerabilidade e a marginalização de migrantes e refugiados” e “o terrível silêncio da sociedade que os rejeita”.

Bispo Flores: de uma diocese fronteiriça

Dom Daniel Ernest Flores, presidente delegado da Assembleia e membro da Comissão Preparatória, bispo de Brownsville, no Texas, a maior diocese dos Estados Unidos da América, na fronteira com o México, começou lembrando que “cada Igreja local no mundo traz seus próprios dons e experiências para o Sínodo”. Contando a experiência de sua diocese fronteiriça, ele disse que, nos últimos anos, o número de pessoas da América Latina que vêm para os Estados Unidos da América através de Brownsville aumentou. Mas a resposta dos fiéis nunca faltou. “Muitos se apresentaram – de donos de restaurantes a enfermeiros – para criar soluções de assistência e ajuda: não temos grandes recursos materiais, mas sabemos o que é a pobreza e somos generosos”, assegurou o prelado, enfatizando que a mesma resposta também veio de muçulmanos, judeus e expoentes de outras religiões e denominações cristãs.

Aqueles que cruzam a fronteira, acrescentou ele, “devem ser tratados com o respeito devido à sua dignidade humana”. E mesmo que a diocese não tenha grandes possibilidades financeiras, é necessário ser “flexível” e se adaptar às situações em constante mudança, tendo em mente o princípio do respeito – especialmente em relação às famílias de migrantes que muitas vezes passam por “experiências terríveis” – e sempre mantendo uma atitude de cooperação com as dioceses vizinhas.

Briefing – XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos 19 de outubro de 2023

O maronita Alwan: o drama dos refugiados sírios no Líbano

O padre Khalil Alwan – ex-superior geral dos Missionários maronitas libaneses, secretário-geral do Conselho dos Patriarcas Católicos do Oriente, professor da Universidade Libanesa em Beirute, que participa como testemunha sinodal para as Igrejas Orientais e coordenador geral para o Oriente Médio, entre os que vêm das assembleias continentais sem receber o “munus” episcopal – disse que participou de quatro sínodos e considera o atual diferente em seus métodos e conteúdo: “É um verdadeiro caminho com o Senhor, com a Igreja, com todas as realidades aqui representadas. Participar dele é uma grande graça que nos dá motivos de esperança por um porvir feliz da Igreja”.

O religioso maronita passou então ao tema principal de sua intervenção, falando sobre a situação dos refugiados sírios no Líbano: “Desde 2011, quando chegaram aí, eles têm vivido em condições desumanas, amontoados em grande número em campos no limite de sua capacidade, porque a comunidade internacional está forçando o Líbano a mantê-los em seu território, impedindo-os de dirigir-se para a Europa”. Nessas áreas, acrescentou o padre Alwan, “vivem mais de dois milhões de pessoas, com muitos nascimentos registrados nos últimos anos. Com sua população de cinco milhões de habitantes, o Líbano é o país com a maior porcentagem de refugiados do mundo”. Várias ajudas humanitárias estão tentando aliviar a situação dramática, observou ele, mas os refugiados devem ter permissão para ir para um lugar que respeite mais a dignidade humana.

Os libaneses estão sendo penalizados “por sua humanidade”, ressaltou o padre Alwan. Todos esses refugiados, na verdade, sobrecarregam a economia do Estado, que arca com custos enormes que as organizações governamentais internacionais não são capazes de enfrentar, o que faz com que “os cidadãos libaneses fiquem cada vez mais pobres. Isso causa muita raiva neles: eles veem a questão humanitária como um pretexto para manter os refugiados no Líbano, que é forçado a ser um país de asilo político. Muitas vozes se levantaram –  concluiu o clérigo – pedindo que os sírios partam para a Europa. Estamos enfrentando uma tragédia humana e oraremos esta noite para que as potências do mundo trabalhem para pôr um fim a ela e para que os sírios possam um dia retornar ao seu país e à sua cultura”.

Os participantes do Sínodo em oração (Vatican Media)

Os participantes do Sínodo em oração (Vatican Media)

O bispo Mpako: acolhimento, escuta, respeito

Dom Dabula Anthony Mpako, arcebispo de Pretória e vice-presidente da Conferência Episcopal da África do Sul, descreveu inicialmente a situação dos migrantes e refugiados em seu país. Apreciando a oportunidade de participar da “conversa no Espírito” como um método do processo sinodal, o arcebispo disse que, com escuta, respeito e acolhimento, as pessoas podem realmente se expressar e acolher umas às outras. “Se penso em meu país – disse ele -, posso dizer com segurança que temos um terreno fértil para tornar esse método nosso”, que servirá para enfrentar “o desafio de poder oferecer um lugar e uma cultura pastoral aos migrantes e refugiados”.

Acolhemos oficialmente 2,9 milhões de migrantes: na realidade, são muito mais, e o principal motivo da presença deles na África do Sul é a pobreza: a maioria deles são refugiados econômicos”, explicou o arcebispo de Pretória, uma cidade que, juntamente com Joanesburgo, está entre as mais “populares” para os migrantes que se dirigem à África do Sul. Em Pretória, disse dom Mpako, “temos um ministério para cuidar de migrantes e refugiados, tentando ajudá-los também com necessidades práticas, como fornecimento de alimentos, roupas e assistência médica, além de acompanhar a papelada para obter o status de refugiado”. Muitos deles, prosseguiu o prelado, “são católicos que querem continuar praticando sua fé. Eles geralmente se encontram isolados em sua diáspora. Tentamos garantir que eles sejam integrados à realidade católica local, envolvendo também padres dos países de origem dos migrantes”.

Sinodalidade e hierarquia na Igreja

Respondendo à pergunta se a renovação das estruturas com base na sinodalidade poderia minar a autoridade e as prerrogativas dos bispos nas dioceses, o bispo Flores observou que essa questão não é nova. O exercício da autoridade e do ministério pela Igreja, disse ele, deve se basear na conversão do coração, porque isso é essencial para que qualquer estrutura atinja objetivos positivos. Certamente há muitas opiniões no cerne da questão, observou ele, dizendo que está mais preocupado em como podemos nos tornar um povo que se concentra em servir uns aos outros. Isso é fundamental, enfatizou. Podemos mudar tudo, mas se isso não acontecer, não estaremos respondendo ao chamado inicial do Evangelho. De fato, a conversão do coração é fundamental: sejam bispos, leigos, mas todos batizados.

O arcebispo Mpako somou-se a ele na intervenção, lembrando que é comumente aceito por todos que as duas estruturas devem coexistir: a sinodalidade e a hierarquia na Igreja. Não há dúvida, acrescentou, de que gostaríamos de ver como esses dois aspectos podem funcionar juntos e que a sinodalidade comece a permear a estrutura hierárquica da Igreja. Por outro lado, está claro que na Igreja católica a sinodalidade tem um caráter único, porque é uma sinodalidade cujo centro é a cátedra do Papa.

A presença do Espírito

Posteriormente, perguntaram ao cardeal Czerny se a questão fundamental de manter juntas a unidade e a diversidade de contextos, culturas e tradições, por meio de uma mudança de mentalidade e estruturas, é compartilhada entre os sinodais. O purpurado respondeu que não se trata de um problema “minimamente preocupante: as estruturas hierárquicas da Igreja não têm nada a temer do processo sinodal que começa com a escuta. É impossível que isso prejudique a natureza hierárquica da Igreja. A oração ajudará a estrutura e o funcionamento da Igreja por meio do Espírito Santo, melhorando-os. E isso nos deixa felizes por não estarmos apenas falando sobre essas coisas, mas por estarmos vivendo essa espiritualidade. Sentados em uma mesa, talvez digamos que um grupo não tem esperança; em vez disso, depois de dois dias, percebemos que há uma atmosfera coerente, mesmo em relação a questões muito abstratas. E isso sem o Espírito não poderia acontecer”.

O rosto de Cristo naqueles que sofrem

A uma pergunta sobre a presença de pessoas Lgbtq+ também entre os migrantes, o prelado sul-africano Mpako respondeu que “a posição da Igreja é clara sobre como lidar com elas: em primeiro lugar, demonstrando compaixão, sem discriminar ninguém e sem fazer com que ninguém se sinta um estranho na comunidade da Igreja. O Santo Padre exemplificou tudo isso de uma forma muito bonita”, acrescentou, embora seja necessário confrontar-se com a antropologia cristã tradicional. De fato, para o bispo, esse é “um problema que não pode ser resolvido imediatamente, porque estamos lidando com uma tradição que existe há muito tempo; portanto, há duas coisas acontecendo ao mesmo tempo: mantendo-se seguro nessa tradição, procuramos maneiras de fazer com que essas pessoas se sintam em lar na Igreja”. Por sua vez, Flores disse que em sua diocese ele considera “uma missão de caridade da Igreja receber famílias em situações difíceis”, pais e crianças juntos; portanto, ele incentiva “os voluntários a identificar o rosto de Cristo naqueles que sofrem. Não perguntamos se eles são católicos ou cristãos, quais são suas convicções políticas ou orientação sexual; queremos servir ao Cristo sofredor: é a atitude evangélica da Igreja”.

A Assembleia do Sínodo (Vatican Media)

A Assembleia do Sínodo (Vatican Media)

O confronto entre culturas

Dom Flores também foi questionado sobre a visão do Sínodo em relação às necessidades das culturas latino-americanas. O prelado respondeu que, embora não seja fácil, especialmente se você fizer isso bem, reunir diferentes culturas é uma expressão de sinodalidade. E falou de sua experiência pessoal como um homem que cresceu em uma família bilíngue, onde não há separação entre as culturas latino-americana e anglo-americana. É uma questão, explicou ele, de tentar traduzir um mundo para o outro. Os jovens sabem fazer isso muito bem, concluiu, e isso é uma riqueza, sobretudo para aqueles que, como ele, vivem em uma área de fronteira. No entanto, advertiu, não se pode simplificar em nível eclesial; pelo contrário, é preciso se esforçar para progredir em conversas mais estruturadas entre as Igrejas da América do Norte e da América do Sul. O cardeal Czerny também “viveu em dois mundos” e, para ele, a vida também é “tradução”; e “sinodalidade também significa como traduzir algo de uma cultura para outra”.

Nenhuma pressão ou conspiração externa sobre o Sínodo

Alguns esclarecimentos metodológicos sobre as intervenções nos Círculos Menores e a votação do documento de síntese foram oferecidos pelo prefeito Ruffini em resposta a uma pergunta. Em seguida, o cardeal Czerny falou sobre a relação entre ordem e ofício no que diz respeito aos ministérios ordenados, enquanto Flores e Mpako asseguraram que a reflexão dos sinodais não é influenciada por pressões ou “conspirações” externas: “trocamos opiniões honestas e sinceras sub tutela Petri“, disse o bispo estadunidense, enquanto o prelado sul-africano confirmou que o “desafio” enfrentado pela assembleia é responder à necessidade de criar “uma Igreja mais sinodal”. Por fim, o prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral tomou a palavra para dar alguns detalhes sobre a celebração da noite desta quinta-feira na Praça São Pedro pelos os migrantes.

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