O novo sino tocará suas primeiras badaladas às 11h04, momento em que, em 9 de agosto de 1945, a bomba atômica explodiu nos céus de Nagasaki. “O fato de o sino destruído por uma bomba atômica fabricada e lançada pelos Estados Unidos ter sido reconstruído e doado por cidadãos estadunidenses, e acolhido pela igreja em Urakami, representa um sinal concreto de perdão, reconciliação e esperança”, diz o arcebispo de Nagasaki.
Por Fabio Beretta*
Prédios arrasados, seres vivos desintegrados, pessoas mortas em segundos por uma energia tão devastadora que hoje restam deles apenas sombras nas paredes ou no asfalto. No horrível rastro de destruição causado pelo impacto da bomba atômica em Nagasaki, há exatos 80 anos, um dos dois sinos dentro da antiga Catedral de Urakami também foi levado pela onda atômica.
Quando a igreja foi reconstruída, aquele nicho permaneceu vazio. Nos últimos meses, vários católicos estadunidenses arrecadaram fundos para reconstruir aquele sino e o doaram à Catedral, como relatou à Agência Fides dom Peter Michiaki Nakamura, arcebispo de Nagasaki: “Este novo sino foi instalado recentemente na torre vazia e tocará pela primeira vez no exato momento em que, em 9 de agosto de 1945, a bomba atômica explodiu nos céus de Nagasaki.”
O novo sino tocará suas primeiras badaladas às 11h04: para o arcebispo, seu som será “uma recordação das vítimas e um apelo à paz. O fato de o sino destruído por uma bomba atômica fabricada e lançada pelos Estados Unidos ter sido reconstruído e doado por cidadãos estadunidenses, e acolhido pela igreja em Urakami, representa um sinal concreto de perdão, reconciliação e esperança”. Em outras palavras, para o pastor da comunidade de Nagasaki, isso “testemunha a possibilidade de caminharmos juntos rumo à concretização da paz mundial”.
Um ano de esperança
“Espero que, cada vez que o som desse sino tocar, as pessoas se lembrem desses eventos e possam se comprometer, com esperança, a construir a paz.” 2025, de fato, para o arcebispo Nakamura, é “o ano da ‘esperança'”.
E não apenas por causa do Jubileu: “2025 marca o 80º aniversário do fim da guerra e do ataque atômico, e é uma oportunidade para refletir mais uma vez sobre a importância de impedir que a guerra ecloda, de rezar pelo fim dos conflitos atualmente em curso em todo o planeta e de promover não apenas a abolição do uso de armas nucleares, mas também sua produção e posse.”
“Muitas pessoas pensam que a guerra seja algo errado”, acrescentou o arcebispo, “mas, ao mesmo tempo, se o Japão fosse atacado por uma potência estrangeira, muitos acreditariam que uma resposta bélica seria inevitável. Por isso, é essencial começar agora a construir laços de cooperação e compreensão mútua, para que a guerra nunca tenha a chance de começar.”
Tendo isso em mente, a Diocese de Nagasaki, juntamente com a Diocese de Hiroshima, iniciou uma parceria com as Dioceses de Seattle e Santa Fé, nos Estados Unidos, com o objetivo comum de trabalhar por um mundo livre de armas nucleares. “Acho muito relevante fomentar esse tipo de relacionamento e conexão com outras pessoas”, comentou Nakamura.
Rearmamento e medo
A Conferência Episcopal Japonesa publicou recentemente um documento sobre a paz para comemorar o oitavo aniversário da bomba atômica. O documento levantou uma questão: “O horror e a maldade da guerra são claros para muitos, mas devemos aprender com a experiência de 80 anos atrás e lembrar que ideias e valores transmitidos na vida cotidiana mudaram a opinião pública e levaram a conflitos. O Japão está realmente no caminho da paz hoje?”
Para o arcebispo de Nagasaki, “considerando a expansão dos armamentos e o atual sistema educacional no Japão, é difícil dizer que o país está realmente no caminho da paz. A sociedade japonesa também é altamente competitiva, frequentemente dominada pela busca do lucro e pelo materialismo acentuado. Em tal sociedade, existe o risco de guerras baseadas em luta e conquista.”
A questão levantada pelos bispos japoneses no documento decorre da recente implantação de sistemas de mísseis em Okinawa e nas Ilhas Nansei “para fins defensivos”. “Mesmo na região de Kyushu, bases militares estão sendo reforçadas para fins defensivos”, explicou o prelado. Questionado sobre como os jovens estão reagindo a esse aumento militar, ele enfatizou: “Acredito que muitos jovens, não apenas católicos, não têm uma compreensão real de quão trágica e desumana é a guerra. Embora a educação para a paz seja ensinada nas escolas, ela é principalmente teórica ou puramente factual. Recentemente, soube-se que o Ministério da Defesa enviou às escolas panfletos explicando em termos acessíveis a ‘necessidade e legitimidade da defesa’.”
Para o arcebispo, a Igreja “deve garantir que a educação escolar não se torne, sem que percebamos, unilateral e voltada para a preparação para a guerra, promovendo a ideia enganosa de que a paz pode ser alcançada pela força militar”. Nesse contexto, Nakamura observou: “a Igreja tem o dever de testemunhar o amor, o perdão e a entrega aos outros, não apenas com palavras, mas com um estilo de vida concreto”.
“Lutar” pela paz
O arcebispo recordou que durante a Segunda Guerra Mundial, “o Japão também cometeu atos cruéis e desprezíveis contra outros países. Na época, porém, diante desses horrores, a Igreja Católica Japonesa não conseguiu expressar forte antítese ou protesto. Uma razão pode ter sido que, durante a guerra, os cristãos eram chamados de ‘yaso‘ (um termo depreciativo para cristãos, ndr.) e discriminados por serem considerados ‘antipatriotas’. Qualquer pessoa que se opusesse ao conflito, mesmo os não cristãos, era rotulada assim. Apesar disso, acredito que, mesmo correndo o risco de perseguição, faltou-lhes a coragem ou a força para clamar pela paz.”
“Hoje, porém, a Conferência Episcopal pode e deve difundir mensagens de paz. E, claro, rezar pela paz. Após a visita de dois Papas ao Japão, o povo japonês percebeu mais profundamente o relevante papel da Igreja na promoção da paz. Apoiada pela mensagem e pelo compromisso do Sucessor de Pedro, a Igreja no Japão, como nação atingida por bombas atômicas, acredita que pode cumprir cada vez mais seu dever de mensageira da paz.”
*Agência Fides