Trinta anos após o terrível massacre que custou a vida de mais de 8 mil muçulmanos bósnios dom Tomo Vukšić , arcebispo de Vrhbosna, Sarajevo, fala sobre a necessidade de colóquio e compreensão para superar a dor e o espanto. “O colóquio é fundamental, principalmente o inter-religioso. A Igreja está muito empenhada nisso”
Federico Piana – Vatican News
Seu sentimento nunca mudou, permanece idêntico ao dia em que soube do terrível massacre de Srebrenica. “Por um lado, há a incredulidade e o desconcerto diante da impotência da comunidade internacional em impedir uma tragédia horripilante como aquela e, por outro, há a oração pelos mortos e a solidariedade humana e cristã com os que sofreram”. Profundos sentimentos do coração que dom Tomo Vukšić, arcebispo de Vrhbosna, Sarajevo e presidente da Conferência Episcopal da Bósnia e Herzegovina, compartilha também com toda a Igreja local: “E esses nossos sentimentos se renovam também diante das tragédias bélicas que até os nossos dias continuam a se repetir. Como se o mundo não tivesse aprendido nada com as tragédias anteriores”.
A tragédia pouco ensinou ao mundo
Dom Tomo Vukšić, que também é presidente do Conselho Inter-religioso da Bósnia e Herzegovina, logo esclarece que o massacre de Srebrenica pouco ensinou à comunidade internacional e à própria Europa: “É difícil — admite — refletir sobre o quanto a Europa e a comunidade internacional aprenderam, até porque é preciso levar em conta que a Europa é uma realidade complexa: ela não é apenas a União Europeia. Contudo, a partir dos conflitos que devastam o mundo, certamente se pode afirmar que Srebrenica não ensinou muito, assim como o conflito em Ruanda e as guerras em outras nações”.
Um processo longo
Trinta anos após o massacre, do qual a humanidade inteira ainda carrega cicatrizes profundas, dom Vukšić foca na pacificação da memória, que continua sendo uma tarefa necessária, mas difícil. “É um processo longo e exige muita paciência e perseverança. Ao mesmo tempo, é o pressuposto do perdão e da reconciliação que, junto com a justiça, são os fundamentos da paz justa e duradoura. Alcançamos alguns resultados, mas ainda há muito a fazer. E a Doutrina Social da Igreja pode ser de grande ajuda nesse sentido”.
Reconciliação com colóquio
A completa reconciliação na Bósnia e Herzegovina só poderá ser alcançada continuando a promover o colóquio, inclusive o inter-religioso. Algo que a Igreja local tem feito há muito tempo, sem desanimar diante das dificuldades que inevitavelmente se encontram, assegura o arcebispo: “Por exemplo, em nossa Faculdade de Teologia, há anos foi organizado um mestrado onde estudam pessoas de diferentes fés e também ensinam professores ortodoxos e muçulmanos. Além disso, em nossas escolas católicas, frequentadas por jovens de diferentes fés, além da religião católica, são ensinadas a ortodoxa e a muçulmana. Um esforço que se associa ao trabalho do Conselho Inter-religioso do qual faço parte como presidente”.
Percepção profunda da essência social
A cura das feridas, especialmente as psicológicas, não pode prescindir da compreensão profunda da essência social da nação que “se compõe — acrescenta — de três grupos religiosos: os muçulmanos que etnicamente são bósnios; os ortodoxos que etnicamente são sérvios e os católicos que etnicamente são croatas. Cada uma dessas comunidades sofreu muito durante a guerra e houve vítimas de todas as partes. E nenhuma vítima deve ser esquecida”.
O dever de não esquecer
Hoje, o dever da memória torna-se ainda mais necessário e atual, pois a situação política na região, há alguns anos, é marcada por muitas polêmicas, muitas vezes até ameaçadoras: “Nós, bispos, em um comunicado, expressamos nossa preocupação devido a comportamentos imprudentes e declarações irrefletidas de alguns representantes políticos que, com suas ações, provocam um sentimento de insegurança e medo nas pessoas. Além disso, esperamos que os representantes da comunidade internacional também forneçam sua ajuda para achar um sistema eleitoral justo e também para contribuir para a implementação da necessária reforma constitucional e jurídica”.
Orações silenciosas
Para evitar que os erros e as tragédias do passado se repitam, a Conferência Episcopal continua a sustentar que o colóquio é o único caminho moralmente aceitável que os representantes eleitos devem seguir para alcançar uma solução justa, necessária para a segurança de toda a população. E o massacre de Srebrenica ainda hoje está aqui para testemunhar: como antes, a ausência de confronto e de compreensão poderia gerar novos monstros. “Diante de tantas mortes e tanta dor — explica o arcebispo —, o homem honesto deve procurar fazer o máximo possível para expressar solidariedade às vítimas, orar em silêncio e deixar às instituições e às leis a tarefa de fazer justiça”.