No país africano devastado por uma guerra sem fim, milhares de pessoas morreram e dez milhões estão desabrigadas. O relato dramático de um religioso: “Leigos, sacerdotes e religiosas também estão fugindo daqui. Quem pode tenta ir para o Sudão do Sul, Chade e Egito.” A Igreja continua ajudando.
Federico Piana – Vatican News
Todos estão fugindo do Sudão. Os homens fogem, horrorizados com uma guerra entre o Exército e as milícias que só traz devastação e morte. As mulheres fogem, exaltadas pela urgência de colocar seus filhos em segurança. Os muçulmanos fogem, maioria religiosa cansada de ver suas casas e lojas atacadas, de ver seus entes queridos degolados ou fuzilados a sangue frio. Também fogem os católicos, que antes do início do conflito eram uma pequena minoria de um milhão de pessoas, mas hoje são apenas metade desse número. Eles tentam fugir para onde podem, para o Sudão do Sul, Chade, Egito. Querem esquecer os horrores, conforme relatado à mídia vaticana por um religioso que prefere permanecer anônimo para não colocar em risco sua própria segurança e a de seus irmãos na fé: “Na cidade de Sennar, há alguns dias, um mercado foi arrasado por bombas. As vítimas foram cerca de quarenta pessoas pobres, cujo único crime foi procurar comida para tentar sobreviver.”
O esquecimento da informação
Uma notícia que ficou atolada nas profundezas da informação internacional que também ignorou dezenas de outras tragédias diárias como a ocorrida em meados de agosto passado em El Obeid, capital do Estado de Kordofan, no norte do país africano. O religioso emociona-se ao tentar recordá-la, a sua voz quase embarga: “Dezenas de crianças morreram sob os escombros de uma escola que foi destruída por mísseis. Um ataque absurdo e deliberado do qual ninguém teve pena.” Ninguém se importa com uma guerra, travada há mais de um ano apenas pela conquista do poder, que opõe o Exército e os milicianos, e que vive uma situação de impasse dramático: Cartum, a capital, devastada por bombardeios contínuos; as aldeias de Darfur, província ocidental da nação, completamente incendiadas e saqueadas, uma vez pelo Exército e outra pelas milícias; as cidades de El Obeid, Sennar e Kaduqli tornaram-se cidades fantasmas por causa dos ataques de metralhadoras e canhões. Não se ganha e não se perde, apenas continua-se morrendo.
Feridas profundas
Quando ele começa a descrever a situação da Igreja local nesse inferno de cadáveres e desespero, nossa fonte suspira: “Religiosos estrangeiros, sacerdotes diocesanos, leigos: quase todos fugiram. Não sobrou quase ninguém. Na Arquidiocese de Cartum, por exemplo, restam apenas três sacerdotes que mantêm a vida sacramental viva da melhor forma possível. Somente na cidade de Port Sudan, no nordeste da arquidiocese, há uma grande presença de religiosos combonianos, de irmãs de Madre Teresa e de outra congregação de religiosas indianas”. A situação não é melhor na Diocese de El Obeid, onde o bispo só pode contar com três sacerdotes. Muitos deles, talvez a maioria, fugiram para as montanhas Nuba, onde a guerra ainda não chegou, e para o Sudão do Sul”, disse o sacerdote. Com a mesma proporção de sacerdotes e religiosas, os leigos também fugiram do país ou estão pensando em fazer isso. Para aqueles que permanecem, a Igreja local tenta garantir a celebração dos sacramentos, mesmo ao custo de ter que alcançá-los nas áreas mais remotas e inacessíveis. O religioso se orgulha de dizer que, apesar de tudo, “as pequenas comunidades católicas que encontraram abrigo em vilarejos distantes podem contar com a presença de catequistas, aos quais é confiada a liturgia da Palavra, e, às vezes, dos poucos sacerdotes restantes que vão até elas com dificuldade e abnegação”.
A caridade da Igreja
O compromisso prioritário da Igreja local passou a ser também o de assistir e apoiar a população. Alimentos, água, remédios, cobertores custam cada vez mais e levá-los ao destino é uma tarefa complicada. No entanto, o sacerdote confirma que já há algum tempo “são recolhidos donativos e ofertas com as quais estamos ajudando as pessoas diretamente. Quando possível, também conseguimos levar de uma área para outra aqueles que precisam ir ao hospital. Ajudamos as pessoas caso por caso: não apenas os cristãos, mas qualquer pessoa que esteja necessitada e bata à nossa porta”. Quando questionado se a Igreja poderia tornar-se parte ativa nos processos de pacificação das facções em conflito, o sacerdote não hesita em responder partindo de um fato: “Não temos forças. Não temos canais diplomáticos diretos, como a Nunciatura, com os quais possamos interagir política e institucionalmente. O que a Igreja pode fazer é chamar a atenção da mídia para o que estamos vivendo.” A atenção, no entanto, parece não existir, o esquecimento desceu sobre o Sudão. “É verdade. Mas a Igreja continua falando, mesmo que nos sintamos totalmente abandonados pela Comunidade internacional. É claro que existe a guerra na Ucrânia e na Terra Santa, mas aqui há dez milhões de pessoas deslocadas, milhares de mortos, enquanto um milhão de pessoas corre o risco de morrer de fome. O que mais deverá acontecer a este país infeliz para que o seu grito desesperado seja ouvido?”