Em 30 de abril do ano 2000, II Domingo de Páscoa, no coração do Jubileu, quando João Paulo II proclamou santa a religiosa polonesa Faustina Kowalska. Quantas almas, disse o Papa Wojtyla, foram consoladas pela invocação “Jesus, eu confio em vós” que o próprio Cristo sugeriu à religiosa!
Alessandro Di Bussolo/Mariangela Jaguraba – Cidade do Vaticano
Uma canonização com “uma eloquência particular”, fortemente desejada por João Paulo II para transmitir ao mundo do novo milênio a mensagem de misericórdia do Senhor, “que não apenas perdoa os pecados, mas também atende a todas as necessidades dos homens”, inclinando-se “sobre toda miséria humana, material e espiritual”. Karol Wojtyla, em meio ao Grande Jubileu do ano 2000, explica aos fiéis a proclamação da santidade da bem-aventurada Faustina Kowalska, uma pequena religiosa polonesa a quem Jesus confiou, através de numerosas visões, entre 1926 e 1938, a sua mensagem de misericórdia.
Karol e Faustina, o primeiro encontro depois da morte da mística
Era 30 de abril do ano 2000, domingo seguinte à Solenidade de Páscoa. Poucos dias depois, o Papa cruzaria o limiar dos 80 anos, os últimos anos marcados pela doença. Ele recordou aqueles anos, entre a primeira e a segunda guerra mundial, durante a ocupação nazista da Polônia, em que, de 1940 a 1944, mesmo como seminarista clandestino, trabalhava na fábrica de soda da Solvay, não muito distante do convento das Irmãs da Bem-aventurada Virgem Maria da Misericórdia em Lagiewniki, um subúrbio de Cracóvia, onde a irmã Maria Faustina Kowalska morreu aos 33 anos em 5 de outubro de 1938.
“A humanidade sem paz, se não invocar a Divina Misericórdia”
Naquela homilia, o Papa recordou os “eventos daqueles anos e o sofrimento horrível de milhões de homens”. Lembrou também que amigos e familiares se chamavam “Lolek” e que de 1929 a 1941 perdeu primeiro a mãe, depois o irmão médico (com escarlatina, infectado por um paciente) e, por fim, o pai. Naquele momento, “a mensagem de misericórdia era necessária”. De fato, sublinhou João Paulo II, Jesus disse à irmã Faustina: “A humanidade não encontrará paz até que se volte com confiança à Misericórdia Divina.”
Um jovem com sapatos de madeira rezando em Łagiewniki
Aquele rapaz de 20 anos com sapatos de madeira que parava para rezar no túmulo da irmã Faustina, teria lembrado em 17 de agosto de 2002, a última peregrinação à sua Cracóvia. “Como seria possível imaginar”, teria dito no final da celebração, “que aquele homem com calçados de madeira um dia consagraria a Basílica da Divina Misericórdia de Łagiewniki, em Cracóvia?”
Uma mensagem entregue ao mundo graças à irmã Faustina
Por isso, já como bispo auxiliar de Cracóvia, desde 1958, e depois como sucessor de Pedro, desde 1978, ele sempre seguiu a causa da apóstola da Divina Misericórdia, até ser proclamada beata em 18 de abril de 1993, II Domingo de Páscoa. O que foi transmitido por uma pequena religiosa rejeitada por muitos conventos, antes de ser aceita pelas Irmãs da Bem-aventurada Virgem Maria da Misericórdia, em Varsóvia, e iniciar o noviciado em 30 de abril de 1926, “não é uma mensagem nova”, lembrou o Papa Wojtyla, mas “um presente de iluminação especial”, que o Senhor “quase quis devolver ao mundo através do carisma da irmã Faustina”, e que agora “iluminará o caminho dos homens do Terceiro Milênio”.
Domingo da Divina Misericórdia
Ele proclama que de agora em diante em toda a Igreja “o II Domingo de Páscoa será chamado de ‘Domingo da Divina Misericórdia’, obedecendo, assim, a um pedido feito por Jesus à irmã Faustina, como recordou o Papa Francisco duas semanas atrás na Audiência Geral, para que “possa ser um abrigo e refúgio para todas as almas e especialmente para os pobres pecadores”. De fato, no Evangelho daquele domingo, Jesus ressuscitado dá aos discípulos o anúncio de sua misericórdia: “A quem perdoardes os pecados, eles serão perdoados”.
Do coração do Ressuscitado, a misericórdia ilumina o mundo
A imagem de Jesus Ressuscitado, com dois raios de luz que partem do coração e iluminam o mundo, é a que Cristo pediu à irmã Faustina para pintar e abençoar, com a inscrição “Jesus, eu confio em ti!”.
Esta misericórdia Cristo derrama sobre a humanidade através do envio do Espírito que, na Trindade, é a Pessoa-Amor. A misericórdia não é talvez um “segundo nome” do amor, entendido em seu aspecto mais profundo e tenro, em sua atitude de atender todas as necessidades, especialmente em sua imensa capacidade de perdão?
Uma saúde fraca, mas uma vida que se torna um canto
A sua breve vida, como a Irmã Faustina escreve em seu diário, “Secretária da Divina Misericórdia”, não foi nada fácil, mas Cristo havia anunciado a ela numa visão. Já fraca de constituição, o estilo de vida severo e os jejuns que se impuseram nos treze anos de vida religiosa minaram sua saúde. Ela ficou doente de tuberculose e teve que ser hospitalizada duas vezes num sanatório perto de Cracóvia. Ela sempre aceitou com obediência as humildes tarefas que lhe foram confiadas, de cozinheira, jardineira e porteira, mas “escondida em seu convento de Lagiewniki, em Cracóvia, lembra João Paulo II, fez de sua existência um canto de misericórdia: Misericordias Domini in aeternum cantabo”, diz o Salmo 88.
A canonização da irmã Faustina tem uma eloquência particular: com esse ato pretendo hoje transmitir esta mensagem ao novo milênio. Eu a transmito a todos os homens para que aprendam a conhecer melhor a verdadeira face de Deus e a verdadeira face dos irmãos.
A sua dor pelas dores do próximo, grande amor
O Pontífice que veio da Polônia, que Francisco canonizou em 27 de abril de 2014, junto com João XXIII, concelebrando com o papa emérito Bento XVI (que o beatificou em 1° de maio de 2011), indica no amor de Santa Faustina pelo próximo, a fonte de inspiração para a humanidade de hoje “a fim de enfrentar a crise de significado, os desafios das mais diversas necessidades, sobretudo a exigência de salvaguardar a dignidade de cada pessoa humana”, porque “cada pessoa é preciosa aos olhos de Deus, para cada um Cristo deu sua vida”.
A irmã Faustina Kowalska deixou escrito em seu diário: “Sinto uma dor tremenda quando observo os sofrimentos do próximo. Todas as dores do próximo se repercutem em meu coração; carrego suas angústias em meu coração, de modo que me aniquilam até fisicamente. Eu gostaria que todas as dores caíssem sobre mim, para dar alívio ao próximo” (Diário, pag. 365). Eis a que ponto de partilha leva o amor quando é medido no amor de Deus!
O abandono que consola: Jesus, eu confio em vós!
“A mensagem da Divina Misericórdia”, explicou ainda João Paulo II, “é dirigida sobretudo a quem, aflito por uma provação particularmente difícil ou esmagado pelo peso dos pecados cometidos, perdeu toda a confiança na vida, sendo tentado a ceder ao desespero”.
A doce face de Cristo é apresentada a ele, sobre ele vem aqueles raios que partem de seu coração e iluminam, aquecem, indicam o caminho e infundem esperança.
Esse simples ato de abandono a Jesus atravessa as nuvens mais densas e faz um raio de luz passar na vida de todos.
Viver a experiência da Divina Misericórdia e testemunhá-la
Unamos a nossa voz de Igreja peregrina, é o convite final do Papa Wojtyla, à voz de Maria, “Mãe da misericórdia”, à voz desse nova santa, “que canta a misericórdia na Jerusalém celeste junto com todos os amigos de Deus”.
Que a sua mensagem de luz e esperança se espalhe por todo o mundo, incentive os pecadores a se converter, amenize as rivalidades e ódios, abra os homens e nações à prática da fraternidade. Hoje, fixando nosso olhar contigo na face de Cristo ressuscitado, fazemos nossa a sua oração de abandono confiante e dizemos com seguro esperança: Jesus, eu confio em vós!