Bispos da Amazônia Brasileira exigem medidas urgentes dos governos para combater a Covid-19 na região

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De acordo com os bispos em uma nota pública, os dados do coronavírus na região são alarmantes. Eles lembram dos povos tradicionais, que exigem um maior cuidado e tratamento diferenciado, e também das populações urbanas, especialmente das pessoas que vivem nas periferias das grandes cidades.

Brasília

Diante do cenário da pandemia de Covid-19 na Amazônia, 67 bispos que atuam na Amazônia Brasileira assinaram um nota pública divulgada na manhã desta segunda-feira (04). No texto, liderado pela Comissão Episcopal Especial para a Amazônia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil/CNBB, eles convocam a Igreja e toda a Sociedade para exigir medidas urgentes do Governo Federal, do Congresso Nacional, dos Governos Estaduais e das Assembleias Legislativas.

De acordo com os bispos, os dados do coronavírus na região são alarmantes. Eles lembram dos povos tradicionais, que exigem um maior cuidado e tratamento diferenciado, e também das populações urbanas, especialmente das pessoas que vivem nas periferias das grandes cidades. Na nota, eles afirmam que “a região possui a menor proporção de hospitais do país, de baixa e alta complexidades (apenas 10%)”, o que requer uma atuação urgente dos governos.

Ao final do texto, que foi traduzido para diferentes línguas, inclusive o Tukano (língua indígena), os bispos convocam toda a Igreja e a sociedade para exigirem 13 pontos aos governos, entre eles: “realizar testagem na população indígena para adotar as necessárias medidas de isolamento e evitar a disseminação da COVID-19; fortalecer as medidas de fiscalização contra o desmatamento, mineração e garimpo, sobretudo em terras indígenas e tradicionais e áreas de proteção ambiental; e revogar o Decreto nº 10.239/2020, voltando o Conselho Nacional da Amazônia Legal para o Ministério do Meio Ambiente, com a participação de representantes da FUNAI e do IBAMA e de outras organizações da sociedade civil, indígenas ou indigenistas como o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), que atuam na Amazônia”.

Eis a íntegra da Nota:

NOTA DOS BISPOS DA AMAZÔNIA BRASILEIRA SOBRE A SITUAÇÃO DOS POVOS E DA FLORESTA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

 

“Às operações econômicas que danificam a Amazônia

 há que rotulá-las com o nome devido: tirania e crime”

 “É preciso indignar-se”.

(Papa Francisco – Querida Amazônia, 14-15)

 

Nós bispos da Amazônia, diante do avanço descontrolado da COVID 19 no Brasil, especialmente na Amazônia, manifestamos nossa imensa preocupação e exigimos maior atenção dos governos federal e estaduais à essa enfermidade que cada vez mais se alastra nesta região. Os povos da Amazônia reclamam das autoridades uma atenção especial para que sua vida não seja ainda mais violentada. O índice de letalidade é um dos maiores do país e a sociedade já assiste ao colapso dos sistemas de saúde nas principais cidades, como Manaus e Belém. As estatísticas veiculadas pelos meios de comunicação não correspondem à realidade. A testagem é insuficiente para saber a real expansão do vírus. Muita gente com evidentes sintomas da doença morre em lar sem assistência médica e acesso a um hospital.

Diante deste cenário de pandemia incumbe aos poderes públicos a implementação de estratégias responsáveis de cuidado para com os setores populacionais mais vulneráveis. Os povos indígenas, quilombolas, e outras comunidades tradicionais correm grandes riscos que se estendem também à floresta, dado o papel relevante dessas comunidades em sua conservação.

Os dados são alarmantes: a região possui a menor proporção de hospitais do país, de baixa e alta complexidades (apenas 10%). Extensas áreas do território amazônico não dispõem de leitos de UTI e apenas poucos municípios atendem aos requisitos mínimos recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em número de leitos e de UTIs por habitante (10 leitos de UTI por 100 mil usuários).

Além dos povos da floresta, as populações urbanas, especialmente nas periferias, estão expostas e têm suas condições de vida ainda mais degradadas pela falta de saneamento básico, moradia digna, alimentação e emprego. São migrantes, refugiados, indígenas urbanos, trabalhadores das indústrias, trabalhadoras domésticas, pessoas que vivem do trabalho informal que clamam pela proteção da saúde. É obrigação do Estado garantir os direitos afirmados na Constituição Federal oferecendo condições mínimas para que possam atravessar este grave momento.

A garimpagem, a mineração e o desmatamento para o monocultivo de soja e a criação de gado para exportação vêm aumentando assustadoramente nos últimos anos. De acordo com o sistema Deter-B, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o desmatamento na floresta Amazônica cresceu 29,9% em março de 2020, se comparado ao mesmo mês do ano passado. Contribuem para esse crescimento o notório afrouxamento das fiscalizações e o contínuo discurso político do governo federal contra a proteção ambiental e as áreas indígenas protegidas pela Constituição Federal (Art. 231 e 232). O coronavírus que nos assola agora e a crise socioambiental já fazem vislumbrar uma imensa tragédia humanitária causada por um colapso estrutural. Com a Amazônia cada vez mais arrasada, sucessivas pandemias ainda virão, piores do que esta que vivemos atualmente.

Preocupa-nos imensamente o aumento da violência no Campo, 23% a mais que em 2018. No ano de 2019, segundo dados do “Caderno Conflitos no Campo Brasil 2019”, da Comissão Pastoral da Terra (CPT Nacional), 84% dos assassinatos (27 de 32) e 73% das tentativas de assassinato (22 de 30) aconteceram na Amazônia. Causas do aumento da violência no campo e do desmatamento da floresta amazônica são sem dúvida a extinção, sucateamento, desestruturação financeira e a instrumentalização política de órgãos como o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) e de órgãos de fiscalização e de controle agrícola, ambiental e trabalhista.

Inquieta-nos também a militarização da Conselho Nacional da Amazônia Legal, conforme Decreto nº 10.239, de 11 de fevereiro de 2020, formado somente pelo governo federal, sem a participação dos estados, dos municípios, nem da sociedade civil, e a sua transferência do Ministério do Meio Ambiente para a Vice-Presidência da República.

Nós, bispos da Amazônia brasileira que assinamos esta nota, convocamos a Igreja e toda a Sociedade para exigir medidas urgentes do Governo Federal, do Congresso Nacional, dos Governos Estaduais e das Assembleias Legislativas, a fim de:

  • Salvar vidas humanas, reconstruir comunidades e relações por meio do fortalecimento de políticas públicas, em especial do Sistema Único de Saúde (SUS);
  • Repudiar discursos que desqualificam e desacreditam a eficácia das estratégias científicas;
  • Adotar medidas restritivas à entrada de pessoas em todos os territórios indígenas, em função do risco de transmissão do novo coronavírus, exceto para os profissionais dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI);
  • Realizar testagem na população indígena para adotar as necessárias medidas de isolamento e evitar a disseminação da COVID-19;
  • Fornecer os equipamentos de proteção individual (EPI) recomendados pela Organização Mundial de Saúde, em quantidade adequada e com instruções de uso e descarte corretos;
  • Proteger os profissionais de saúde que estão atuando nas frentes da saúde dos povos, acompanhando-os também nas suas fragilidades psicológicas e físicas;
  • Garantir a segurança alimentar dos núcleos familiares indígenas, quilombolas, ribeirinhos e demais populações tradicionais da Amazônia;
  • Fortalecer as medidas de fiscalização contra o desmatamento, mineração e garimpo, sobretudo em terras indígenas e tradicionais e áreas de proteção ambiental;
  • Garantir a participação da sociedade civil, movimentos sociais e de representantes das populações tradicionais nos espaços de deliberações políticas;
  • Rejeitar a Medida Provisória 910/2019, que propõe uma nova regularização fundiária no Brasil, pois ela elimina a reforma agrária, a regularização de territórios dos povos originários e tradicionais, favorece a grilagem de terras, o desmatamento e os empreendimentos predatórios, regulariza as ocupações ilegais feitas pelo agronegócio, promove a liquidação de terras públicas da União a preços irrisórios e autoriza a aquisição de terras pelo capital estrangeiro, a exploração especulativa de florestas e incentiva a invasão e devastação de terras indígenas e territórios tradicionais;
  • Rejeitar o PL 191/2020 que regulamenta o Artigo 176,1 e o Artigo 231,3 da Constituição Federal estabelecendo as condições específicas para a realização de pesquisa e lavra dos recursos minerais e hídricos em terras indígenas.
  • Revogar o Decreto nº 10.239/2020, voltando o Conselho Nacional da Amazônia Legal para o Ministério do Meio Ambiente, com a participação de representantes da FUNAI e do IBAMA e de outras organizações da sociedade civil, indígenas ou indigenistas como o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), que atuam na Amazônia.
  • Revogar a Instrução Normativa 09/2020 da FUNAI, que permite que a invasão, exploração e até comercialização em terras indígenas ainda não homologadas.

 

A Igreja na Amazônia, após um rico processo de escuta para a realização da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Amazônia, está atenta a estes cenários e exige, ecoando os gritos dos Pobres e da Terra, que sejam tomadas medidas urgentes para barrar atividades predatórias e, ao mesmo tempo, investir esforços em alternativas à falida proposta de progresso e desenvolvimento que destroem a Amazônia e atentam contra a vida de seus povos.

Nossa Senhora de Nazaré, Rainha da Amazônia, nos acompanhe e socorra em nosso desejo de servir aos pobres e na defesa intransigente da justiça e da verdade.

Brasília-DF, 04 de maio de 2020.

 

Assinam esta nota:

Cardeal Cláudio Hummes, OFM – Presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia

 

Regional Norte 1

Dom Adolfo Zon Pereira, S.X – Diocese de Alto Solimões

Dom Edmilson Tadeu Canavarros dos Santos, SDB – Arquidiocese de Manaus (Auxiliar)

Dom Edson Tasquetto Damian – Diocese de São Gabriel da Cachoeira

Dom Fernando Barbosa dos Santos, CM – Diocese de Tefé

Dom José Albuquerque Araújo – Arquidiocese de Manaus (Auxiliar)

Dom José Ionilton Lisboa de Araújo, SDV – Prelazia de Itacoatiara

Dom Marcos Marian Piatek, CSSR – Diocese de Coari

Dom Mário Antônio da Silva – Diocese de Roraima

Dom Mário Pasqualloto, PIME – Arquidiocese de Manaus (Auxiliar Emérito)

Dom Leonardo Ulrich Steiner, OFM – Arquidiocese de Manaus

Dom Zenildo Luiz Pereira da Silva, C.SS.R – Prelazia de Borba

Dom Sérgio Eduardo Castriani, CSSp – Arquidiocese de Manaus (Emérito)

 

Regional Norte 2

Dom Alberto Taveira Corrêa – Arquidiocese de Belém

Dom Alessio Saccardo – Diocese de Ponta de Pedras (Émerito)

Dom Antônio de Assis Ribeiro, SDB – Arquidiocese de Belém (Auxiliar)

Dom Bernardo Johannes Bahlmann, OFM – Diocese de Ôbidos

Dom Carlos Verzeletti – Diocese de Castanhal

Dom Erwin Krautler, CPPS – Diocese do Xingú (Emérito)

Dom Evaristo Pascoal Spengler, OFM – Prelazia do Marajó

Dom Irineu Roman, CSJ – Arquidiocese de Santarém

Dom Jesus Maria Cizaurre Berdonces, OAR – Diocese de Bragança

Dom Jesús María López Mauleón, OAR – Prelazia Alto Xingu /Tucumã

Dom João Muniz Alves, OFM – Diocese do Xingú

Dom José Altevir da Silva, CSSp – Diocese de Cametá

Dom José Azcona Hermoso, OAR – Prelazia do Marajó (Emérito)

Dom José Maria Chaves dos Reis – Diocese de Abaetetuba

Dom Luís Ferrando – Diocese de Bragança (Emérito)

Dom Pedro José Conti – Diocese de Macapá

Dom Teodoro Mendes Tavares, CSSp – Diocese de Ponta de Pedras

Dom Vital Corbellini – Diocese de Marabá

Dom Wilmar Santim, Ocarm – Prelazia de Itaituba

 

Regional Norte 3

Dom Adriano Ciocca Vasino – Prelazia de São Félix do Araguaia

Dom Dominique Marie Jean Denis You – Diocese de Santíssima Conceição do Araguaia

Dom Giovane Pereira de Melo – Diocese de Tocantinópolis

Dom Pedro Brito Guimarães – Arquidiocese de Palmas

Dom Philip Dickmans – Diocese de Miracema do Tocantins

Dom Romualdo Matias Kujawski – Diocese de Porto Nacional

Dom Wellington de Queiroz Vieira – Diocese de Cristalândia

 

Regional Noroeste

Dom Benedito Araújo – Diocese de Guajará-Mirim

Dom Flávio Giovenale, SDB – Diocese de Cruzeiro do Sul

Dom Joaquín Pertiñez Fernández, OAR – Diocese de Rio Branco

Dom Meinrad Francisco Merkel, CSSp – Diocese de Humaitá

Dom Mosé João Pontelo, CSSp – Diocese de Cruzeiro do Sul (Emérito)

Dom Roque Paloschi – Arquidiocese de Porto Velho

Dom Santiago Sánchez Sebastián, OAR – Prelazia de Lábrea

Pe. José Celestino dos Santos – Diocese de Ji-paraná (Administrador Diocesano)

 

Regional Nordeste 5

Dom Armando Martín Gutiérrez, FAM – Diocese de Bacabal

Dom Elio Rama, IMC – Diocese de Pinheiro

Dom Evaldo Carvalho dos Santos, CM – Diocese de Viana

Dom Francisco Lima Soares – Diocese de Carolina

Dom João Kot, OMI – Diocese de Zé Doca

Dom José Belisário da Silva, OFM – Arquidiocese de São Luís do Maranhão

Dom José Valdeci Santos Mendes – Diocese de Brejo

Dom Rubival Cabral Britto, OFMCap – Diocese de Grajaú

Dom Sebastião Bandeira Coêlho – Diocese de Coroatá

Dom Sebastião Lima Duarte – Diocese de Caxias do Maranhão

Dom Vilsom Basso, SCJ – Diocese de Imperatriz

Pe. Nadir  Luís Zancheti – Diocese de Balsas (Administrador Diocesano)

 

Regional Oeste 2

Dom Canísio Klaus – Diocese de Sinop

Dom Derek John Christopher Byrne, SPS – Diocese de Primavera do Leste-Paranatinga

Dom Jacy Diniz Rocha – Diocese de São Luís dos Cárceres

Dom Juventino Kestering – Diocese de Rondonópolis-Guiratinga

Dom Milton Antonio dos Santos, SDB – Arquidiocese de Cuiabá

Dom Neri José Tondello – Diocese de Juína

Dom Protogenes José Luft, SdC – Diocese de Barra do Garças

Dom Vital Chitolina, SCJ – Diocese de Diamantino

 

Fonte: REPAM

 

 

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