A lei, que já havia sido aprovada na Câmara dos Deputados há duas semanas, prevê que as gestantes tenham acesso ao aborto legal até a 14ª semana após a assinatura do consentimento por escrito. “Uma sociedade é definida pela forma como olha para os mais vulneráveis, os mais pobres e os mais indefesos. É isso que caracteriza e identifica a dignidade de um povo e de uma cultura”. Isso diz respeito, em particular, “ao nascituro em seu estado de total indefesa”, disse o presidente da Conferência Episcopal Argentina.
Isabella Piro – Vatican News
Com 38 votos a favor e 29 contra, o Senado da Argentina aprovou na madrugada desta quarta-feira, 30, a lei sobre a interrupção voluntária da gravidez. Assim, o aborto torna-se legal no país.
A medida, previamente aprovada pela Câmara dos Deputados, foi autorizada após doze horas de debate. Não ouvida, portanto, a voz dos bispos que em várias ocasiões, por longos meses, reiteraram a importância de proteger a vida desde a concepção.
Enquanto se aguardava o resultado da votação, era realizada uma manifestação em frente ao Senado, na presença de milhares de católicos, evangélicos e membros de organizações que trabalham pela proteção da vida, reunidos sob o lema “Por a #Natal sem aborto: façamos história de novo”. Outras mobilizações e momentos de oração foram realizados em várias províncias do país, também em adesão ao “Dia de jejum e oração” promovido pela Conferência Episcopal Argentina para o dia 28 de dezembro, memória litúrgica dos Santos Inocentes mártires.
Nas homilias das Missas daquele dia, vários prelados reafirmaram a sacralidade da vida e a necessidade de protegê-la, instando os legisladores a suspender o projeto de lei em debate. O arcebispo de Corrientes, Dom Andrés Stanovnik, por exemplo, reiterou que “a vida é sempre um dom de Deus e como tal é sempre bem-vinda”. “Verdade, liberdade, justiça e amor andam de mãos dadas – acrescentou – porque são valores inerentes à dignidade da pessoa, desde a concepção até a morte natural”.
No mesmo sentido, o arcebispo de La Plata, Dom Víctor Manuel Fernández que, ainda na Missa celebrada no dia 28 de dezembro, pediu: “Rezemos ao Senhor para que infunda em nosso povo e em nossas autoridades um profundo espírito de amor e solicitude pela vida. Rezemos também por nós, para que sejamos coerentes na defesa da vida em todas as fases, próximos aos abandonados, aos marginalizados, aos descartados por uma sociedade egoísta”.
O prelado também fez um forte apelo a “ficar ao lado das mulheres que estão passando por uma situação difícil e que são tentadas a buscar uma saída com o aborto”. “Os fiéis – destacou Dom Fernández – amam a vida e a defendem não só pela fé, mas também por sólidas convicções humanas, as mesmas que até um ateu poderia ter”. Além disso, o prelado deplorou “a tentativa de reduzir o aborto a uma emergência de saúde pública”, ao passo que “cada pessoa humana tem uma dignidade inviolável, que vai além de todas as circunstâncias”, porque tem a ver com “o plano de amor de Deus”.
Também o arcebispo de Buenos Aires, Cardeal Mario Aurelio Poli, no dia 28 de dezembro, presidiu uma Missa na Catedral Metropolitana na qual invocou a necessidade de proteger os nascituros, “almas inocentes”.
“A grande provação da pandemia que sofre toda a família humana e que na Argentina tem ainda consequências muito dolorosas – disse o cardeal – faz-nos refletir sobre a dignidade de cada vida, sobre o valor de cada ser humano”, seja “idoso, com deficiência, doente ou ainda não nascido”.
Neste sentido, a condenação do arcebispo à “obsessão febril” e à “urgência incompreensível” dos políticos que, precisamente nestes tempos, decidiram legislar sobre o aborto, como se isso “tivesse a ver com sofrimentos, medos e preocupações” da população. Pelo contrário, o que se deve fazer – reiterou o cardeal – é “proteger os direitos humanos dos mais fracos, de modo tal que não sejam negados, mesmo que ainda não tenham nascido”.
Digno de nota, que o presidente da Conferência Episcopal Argentina já havia se manifestado nos primeiros dias de dezembro: em uma mensagem em vídeo, Dom Oscar Vicente Ojea, exortou o país a dizer não à cultura do descarte e a refletir sobre o que significa respeitar a vida e seu valor intrínseco.
“Uma sociedade é definida pela forma como olha para os mais vulneráveis, os mais pobres e os mais indefesos – disse – É isso que caracteriza e identifica a dignidade de um povo e de uma cultura”. Isso diz respeito, em particular, “ao nascituro em seu estado de total indefesa”. Diante de uma gravidez inesperada, reiterava Dom Ojea, “não se trata de interromper a fonte da vida, mas de abrir espaço para aqueles que são chamados à vida, para que dela possam fazer parte”. E isto “é um apelo à generosidade das pessoas, para que todos sejam bem-vindos, não somente à custa dos outros que acabam por ser rejeitados”.
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